Casos de violência patrimonial acompanhados de negligência investigativa têm se tornado cada vez mais frequentes em Alagoas. Um dos exemplos mais emblemáticos é o da advogada Adriana Mangabeira Wanderley, que desde agosto de 2023 aguarda desfecho para o furto ocorrido em sua residência e escritório, localizados em um bairro nobre de Maceió. Quase dois anos depois, o inquérito policial segue sem avanços concretos.
A ação criminosa foi registrada por câmeras de segurança e durou 23 minutos. Os suspeitos chegaram em um veículo T-Cross laranja e utilizaram uma Kombi branca para transportar os objetos furtados, entre eles bens de elevado valor financeiro e afetivo. No momento da invasão, Adriana estava em Brasília a trabalho e foi alertada por uma funcionária. O Boletim de Ocorrência foi registrado no mesmo dia, assim como uma perícia no local, mas o caso estagnou.
Três delegados, nenhum avanço
Desde a abertura do inquérito, o caso passou por três delegados, inclusive pelo então secretário de Segurança Pública, Flávio Saraiva, sem que testemunhas fossem ouvidas ou provas fundamentais analisadas. A advogada aponta falhas graves na condução do processo:
Omissão na oitiva de testemunhas indicadas;
– Desconsideração de imagens de câmeras externas;
– Falta de identificação da placa do T-Cross;
– Negligência com o material genético coletado;
– Ausência de apuração sobre suposto envolvimento de autoridade judicial.
Cansada da lentidão, Adriana protocolou, em outubro de 2023, representação no Ministério Público de Alagoas por suspeita de prevaricação por parte dos responsáveis pela apuração.
O caso assumiu proporções ainda mais graves quando o delegado Daniel José Galvão Mayer, que estava à frente do inquérito, foi preso pela Polícia Federal, acusado de fraude processual, vazamento de informações sigilosas e abuso de autoridade em outro procedimento. De acordo com a advogada Adriana Mangabeira, Mayer teria chegado a identificar um possível mandante do furto — um desembargador — e, mesmo assim, optou por não seguir com a responsabilização da autoridade.
A advogada também levanta questionamentos sobre a legalidade da nomeação do delegado. Segundo Adriana, Daniel Mayer não teria realizado o Teste de Aptidão Física (TAF), etapa obrigatória no concurso da Polícia Civil. “Ele fez as provas escritas, passou em todas as fases, mas não fez o teste físico. Entrou com uma ação na Justiça para ser dispensado dessa etapa, e conseguiu uma liminar concedida pelo juiz Cléber Loureiro, que o considerou apto para assumir o cargo. Assim, foi nomeado mesmo sem cumprir todos os requisitos do edital, com respaldo de uma decisão do Tribunal de Justiça de Maceió”, explica.
Judiciário paralisa investigação
Depois de muita pressão, a polícia concluiu o inquérito nº 8075/2023, que gerou o processo nº 0749421-78.2023.8.02.0001, o qual tramita na 3ª Vara Criminal da Comarca de Maceió, sob responsabilidade do juiz Carlos Henrique Pita Duarte. No entanto, o processo está sem andamento desde o dia 06 de fevereiro de 2025.
O juiz declarou-se incompetente para julgar a ação, e diante disso, a advogada Adriana Mangabeira protocolou petição ao presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Herman Benjamim, solicitando que o processo seja remetido à Corte Superior, argumentando que o Fórum da Capital se recusa a julgar o caso.
Desse modo, por se tratar de um furto que a Polícia Civil Geral do Estado não consegue desvendar e pela possibilidade de envolvimento de autoridade com foro privilegiado, Adriana requer que o processo nº 0749421-78.2023.8.02.0001 seja julgado pelo STJ – Superior Tribunal de Justiça, considerando que o próprio magistrado afirmou não ter competência para julgar os autos.
A advogada também solicitou à promotora Carla Padilha, responsável por investigar casos envolvendo policiais e possíveis erros de justiça, que apurasse o caso. No entanto, segundo Adriana, a promotora também se recusou a investigar.
“Mais do que um furto, vivi um processo doloroso de abandono institucional. A dor do crime é grande, mas o descaso das autoridades é ainda mais devastador”, desabafa Adriana, que segue determinada a responsabilizar não apenas os autores do crime, mas também os agentes públicos que, segundo ela, falharam no dever de investigar.