Fonte: Tribuna Independente
A polêmica envolvendo acordos de indenização a vítimas do afundamento do solo em Maceió ganhou novos contornos nesta quinta-feira (12). Após denúncia do defensor público estadual Ricardo Melro de que a Braskem tentou silenciar a Defensoria Pública de Alagoas (DPE), movimentos sociais e lideranças comunitárias reagiram com veemência em apoio ao defensor.
A controvérsia teve início com uma petição da Braskem, encaminhada à Justiça Federal, na qual a mineradora acusa a DPE de “quebrar sigilo” ao revelar um acordo com moradores do bairro do Farol, atingidos pelas chuvas de maio. O acordo, segundo a empresa, deveria ser confidencial. A Defensoria, no entanto, rebate: o sigilo jamais foi aceito e os próprios beneficiários haviam renunciado formalmente à confidencialidade.
Para o defensor Ricardo Melro, a petição da Braskem não é apenas equivocada — é mentirosa. “A Braskem não cometeu um engano. Ela mentiu ao juízo. Mentira deslavada. E, pior: premeditada”, afirmou. Ele sustenta que há provas documentais, incluindo mensagens trocadas com a advogada da empresa, que demonstram que o sigilo havia sido retirado de comum acordo.
O acordo questionado prevê o pagamento de R$ 211 mil a cada família, sendo R$ 200 mil por danos morais, R$ 5 mil como auxílio-desocupação e R$ 6 mil para aluguel. A empresa, no entanto, afirmou à Justiça que o valor se referia a uma “compensação global”, o que Melro contesta. “Outra mentira. O objeto foi exclusivamente a reparação por dano moral. Está no texto. Está nas conversas”, reforçou.
A preocupação da mineradora, segundo Melro, seria com a possibilidade de o acordo abrir um precedente jurídico. “A empresa deseja ocultar que age com dois pesos e duas medidas: paga o valor justo quando exposta; empurra migalhas quando controla a narrativa”, declarou. A tentativa da Braskem de manter o caso sob sigilo teria como objetivo evitar o colapso do Plano de Compensação Financeira (PCF), estrutura utilizada para pagar valores inferiores em outras áreas impactadas.
A repercussão nas redes sociais foi imediata. O Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) emitiu nota em apoio ao defensor, condenando a postura da empresa. “A verdade sobre a destruição de Maceió não será enterrada sob discursos jurídicos adornados nem sob manobras de bastidores”, afirmou a entidade.
Já o coordenador do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), Cássio Araújo, exaltou o papel da Defensoria. “O trabalho de Melro é digno dos maiores elogios”, disse. O presidente da Associação dos Empreendedores Vítimas da Braskem, Alexandro Sampaio, também se posicionou: “Não é de hoje que a Braskem usa a mentira como escudo para seus crimes contra as pessoas e o meio ambiente”.
O professor Dilson Ferreira, da Ufal, criticou a tentativa de sigilo: “Afasta o controle social, enfraquece a democracia e viola o direito da população atingida de saber como está se dando as indenizações”.
Melro foi ainda mais incisivo: “Quando a verdade ameaça, a Braskem pede sigilo. Mas a dor de uma tragédia não se esconde. Sofre-se no medo, na dignidade ferida, na memória arrancada. A Braskem quer o silêncio para proteger a si mesma, não as vítimas”.
A empresa, segundo ele, chegou a pedir que o acordo fosse retirado dos autos ou, no mínimo, colocado sob sigilo, sob a justificativa de proteger os beneficiários — o que os próprios beneficiários rechaçaram, documentadamente.
Para encerrar sua manifestação, o defensor citou o filósofo Platão: “A real tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz”. E concluiu: “Uma tragédia dessa magnitude não se enfrenta com silêncio, com sigilo ou com acordos à meia-luz. Enfrenta-se com verdade. Com coragem. Com luz plena. Com respeito absoluto à dor de cada vítima”.