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O Livro

por Redação Capital Brasília
7 de novembro de 2025
em Brasil, Política
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O Livro
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Existem hoje 48 exemplares da Bíblia de Guttemberg, conhecida como o primeiro livro impresso do mundo, publicada em 1454. Um deles fica na Universidade de Harvard, que também é importante para entender a história das bruxas de Salém – afinal, na época da caça às bruxas, a universidade tinha um curso de teologia que formava pastores puritanos, alguns dos quais seriam fundamentais nesses julgamentos.

Cidade de Salém à noite
Cidade de Salém à noite

Mais de 500 anos depois da publicação da Bíblia, a jornalista Natalia Viana vai visitar este exemplar para contar sobre outro livro, escrito e publicado apenas 30 anos depois, em 1486, e que influenciou profundamente o pensamento europeu: Malleus Maleficarum, ou Martelo das Bruxas. De autoria de um ex-religioso, Heinrich Kraemer, o livro argumentava que havia uma “pandemia de bruxaria” na Europa e que era preciso identificar as bruxas e submetê-las a julgamentos em tribunais civis.

Malleus Maleficarum, edição de 1576
Malleus Maleficarum, edição de 1576

Foi a partir desse princípio que, na pequena vila de Salém, em 1692, meninas começaram a acusar mulheres de estarem atacando-as de forma espectral. Seus representantes legais, pais e tios, decidiram acusar formalmente essas mulheres diante das autoridades — em especial, três delas: Sarah Good, Sarah Osbourne e a indígena Tituba.

Consulte aqui:

  • Depoimento de Samuel Abbey e Mary Abbey contra Sarah Good
  • Interrogatório de Sarah Good, escrito por Jonathan Corwin
  • Interrogatório e mandado de prisão de Sarah Osborne, conforme registrado por John Hathorne
  • Interrogatório de Tituba, conforme registrado pelo magistrado Jonathan Corwin
  • Interrogatórios de Sarah Good, Sarah Osborne e Tituba, conforme escritos por Joseph Putnam
  • Interrogatórios de Sarah Osborne e Tituba, conforme registrados por Ezekiel Cheever
  • Mandado de prisão de Tituba e Sarah Osborne, e relatório do oficial

Neste episódio, vamos conhecer mais profundamente a história dessas mulheres, os detalhes dos tormentos relatados pelas meninas e até mesmo acompanhar de perto um desses julgamentos.

Nossa viagem no tempo está só começando — ouça agora o episódio 2 de Caça às Bruxas.

Pintura a óleo de 1855 retrata julgamento das bruxas de Salém
Pintura a óleo de 1855 retrata julgamento das bruxas de Salém

Leia abaixo o roteiro do episódio na íntegra:

[Natalia Viana] – 0:00:06
Esse som que vocês estão ouvindo aqui é o som do campus de Harvard, que fica aqui na cidade de Cambridge, pertinho de Boston, e a uma hora e meia de Salém.

[Natalia Viana] – 0:00:21
Esse barulho é o barulho das pessoas que estão andando aqui pelo campus. Você vê grupos de estudantes de várias partes do mundo, caminhando, conversando, saindo de uma aula e entrando para a outra. Você tem também muitos turistas que vêm aqui conhecer a universidade mais antiga. Harvard foi fundada em 1636 como uma escola de formação de pastores, de ministros puritanos.

[Natalia Viana] – 0:00:54
Os jovens vinham para cá para estudar, para se tornarem pastores. E muitos dos pastores, muitos dos ministros, que trabalharam em Salém, inclusive o ministro que esteve lá durante o julgamento, e que é a figura principal de todo o julgamento das bruxas de Salém, eles estudaram aqui, num desses prédios.

[Natalia Viana] – 0:01:18
Aqui na minha frente você tem a estátua de John Harvard, que é o fundador da Universidade de Harvard. A estátua de John Harvard fica logo embaixo de uma enorme bandeira dos Estados Unidos, embora… A Universidade de Harvard tinha sido fundada quando os Estados Unidos ainda era uma colônia, é uma universidade inglesa. E John Harvard, com a sua cara e sua postura de inglês, era, enfim, um puritano inglês.

[Natalia Viana] – 0:01:53
Como eu falei, aqui o burburinho é um pouco maior. Aqui é um grupo de espanhóis, né? Ou latino-americanos. Tem uma tradição aqui que é você tocar o pé da estátua de John Harvard, que pretensamente dá sorte, por causa disso a estátua é toda escura, e apenas os pés do fundador de Harvard são dourados, porque a tinta foi sendo gasta com o tempo. Então você faz uma fila aqui na frente, todo mundo pegando no pé, pegando no pé, literalmente, de John Harvard. E tem um detalhe, um detalhe que é importante para a nossa história. John Harvard, no seu braço direito, está segurando um livro. E vocês vão se lembrar que o livro era um objeto novo, era um objeto que começava a se popularizar, e a Universidade de Harvard também ajudou muito nisso, né?

[Natalia Viana] – 0:02:50
Como a gente sabe, Gutenberg começou a imprimir 200 anos antes. 200 anos naquela época era pouco tempo. 200 anos antes, Gutenberg começou a imprimir, e pouco depois foi impressa a primeira versão do Martelo das Feiticeiras, né? O Malleus Maleficarum, que também é uma das peças mais importantes da nossa história.

[Natalia Viana] – 0:03:24
O Malleus Maleficarum, publicado apenas 30 anos depois de ser inventada a imprensa, é um livro crucial para entender a caça às bruxas de Salém. Por isso, eu fui até Harvard para visitar o primeiro livro já impresso, a Bíblia de Gutenberg.

[Natalia Viana] – 0:03:39
Eu sou Natália Viana e você está ouvindo o podcast Caça às Bruxas: uma história de terror real. Episódio 2: O livro.

[Natalia Viana] – 0:04:00
Hello, just go visit the Bible.

[Sarah Good] – 0:04:03
Unfortunately, we’re not open for touring.

[Natalia Viana] – 0:04:08
Not even two previous students.

[Natalia Viana] – 0:04:11
Estamos no ano de 2023 e eu estou visitando a universidade onde eu estudei no ano anterior. A recepcionista me diz que a biblioteca não está aberta para turistas, mas eu mostro a minha carteirinha de Harvard, e ela libera a entrada.

[Natalia Viana] – 0:04:25
A Bíblia de Gutenberg, uma das poucas que existem, são em dezenas as que ainda sobrevivem. Ela está dentro de um vidro, dentro de uma caixa de madeira, aberta e… Uma caixa de madeira coberta por vidro. Você pode ver ela através da vitrine. É um objeto muito bonito. A Bíblia, ela tem o lado de todas as páginas é dourado, a capa dela é vermelha, em couro. Dentro dela, as letras são aquele estilo gótico alemão, sabe? Aquilo que a gente associa muito com cerveja. Ela tem duas colunas em cada página, como se fosse um jornal, né? Duas colunas. Todo escrito em estilo gótico. É um pouco difícil de ler, e, obviamente, além do mais, ela é em latim. Mas, o jeito que ela foi impressa, a impressão foi feita para todas as páginas, e depois, como era prática na época, cada um dos parágrafos tinha uma grande letra inicial pintada à mão. Uma letra inicial muito maior do que as outras linhas, tomando, sei lá, umas seis linhas, toda pintada à mão.

[Natalia Viana] – 0:05:55
Se hoje vivemos em um momento caótico e assustados por causa da adoção rápida de novas tecnologias da comunicação, a Bíblia, que estava na minha frente lá em Harvard, demonstra que essa não é a primeira vez que novas tecnologias podem ser revolucionárias e disruptivas, mas também podem causar atrocidades.

[Natalia Viana] – 0:06:16
A Bíblia de Gutenberg é o livro impresso mais antigo do mundo e o mais famoso desde que o ser humano começou a poder imprimir em larga escala. Mas ali mesmo, na Alemanha, onde Gutenberg imprimiu a sua Bíblia, apenas 30 anos depois foi impresso um outro livro revolucionário e verdadeiramente grotesco, O Malleus Maleficarum, ou Martelo das Bruxas.

[Natalia Viana] – 0:06:47
Para essa investigação, eu comprei um exemplar desse livro, obviamente com linguagem atualizada. O Malleus foi escrito em 1486 pelo clérigo Heinrich Kramer, um alemão que tinha uma ideia fixa: era necessário que se criasse uma maneira de detectar, julgar e condenar bruxas à morte. Heinrich havia tentado isso em uma cidadezinha chamada Innsbruck, na região de Tirol, no oeste da Alemanha, mas acabou expulso da igreja. Então ele decidiu reunir tudo o que sabia em um livro como uma maneira de convencer mais pessoas. E funcionou.

[Natalia Viana] – 0:07:27
O Malleus explicava de maneira detalhada como qualquer pessoa leiga poderia descobrir se alguém estava envolvido em bruxaria. Isso valia para mulher ou para homem, mas um dos principais argumentos de Kramer era que a maior parte das bruxas eram mulheres. O próprio nome diz: Malleus Maleficarum significa o martelo das feiticeiras no feminino. O livro acusa as mulheres bruxas de uma variedade de crimes e entre eles está com muito destaque o infanticídio. A morte de crianças e também de animais inocentes. Também há descrições de feitiços sobre outras pessoas, causando mal-estar, doenças, espasmos e surtos. Elas são acusadas até de terem o poder de causar impotência ou de roubar o pênis dos homens.

[Natalia Viana] – 0:08:22
O livro também desacreditava qualquer um que questionasse a existência da bruxaria e tinha o objetivo expresso de criar uma sistematização racional para determinar como os juízes poderiam usar sua metodologia para detectar e julgar as bruxas.

[Natalia Viana] – 0:08:39
A lógica do Malleus era de retirar da Igreja Católica a punição desses crimes. Na época, a heresia era punida pela Igreja até com morte. O que o Malleus fez foi dizer que havia uma epidemia de bruxaria na sociedade e que seria preciso que a própria sociedade assumisse essa batalha. Ou seja, a bruxaria deveria passar a ser tratada como um crime comum, com procedimentos padrões para ser registrado e investigado por homens leigos.

[Natalia Viana] – 0:09:08
Então, você sabe muito bem como funciona. Ele virou um sucesso absoluto entre a população. Viralizou. E ele foi feito para isso. Tinha 20 centímetros de comprimento e 190 páginas. Já foi pensado para ser guardado no bolso do casaco e viajar junto com seu dono. O livro fez tanto sucesso que se espalhou por toda a Europa. Foram publicadas nada menos que 28 edições do Malleus entre 1486 e 1600.

[Natalia Viana] – 0:09:40
Seus ensinamentos viraram tão estabelecidos na sociedade que foram usados 200 anos depois no julgamento das bruxas de Salém.

[Natalia Viana] – 0:09:49
E se você não acredita no poder do livro impresso, e em particular deste livro impresso, pense nisso: antes dos anos 1400, poucas pessoas eram julgadas em cortes por bruxaria. Depois, a Europa viveu uma espécie de crise. A bruxaria passou a ser amplamente culpada como raiz de todo o mal social e os julgamentos se espalharam por todo o continente e para as colônias. A maioria dos julgamentos por bruxaria ocorreu entre 1560 e 1630. E o Malleus tornou-se o grande manual, o grande código penal de como julgar bruxas.

[Natalia Viana] – 0:10:28
Mas está na hora de voltarmos a Salém, na região da Nova Inglaterra, domínio colonial inglês na América do Norte. O ano é 1692.

[Natalia Viana] – 0:10:44
Na casa do pastor Samuel Parris, duas meninas pequenas, Betty Parris e sua prima, Abigail Williams, foram tomadas por uma doença inexplicável. Elas tinham surtos, contorciam-se no chão, como se estivessem sendo torturadas por espectros invisíveis.

[Natalia Viana] – 0:11:12
Boa tarde, doutor William Griggs. Muito obrigada por me receber aqui na sua casa.

[William Griggs] – 0:11:15
Boa tarde. Gostaria de um chá?

[Natalia Viana] – 0:11:18
Gostaria. Obrigada.

[William Griggs] – 0:11:32
Aqui.

[Natalia Viana] – 0:11:32
Muito bom.

[Natalia Viana] – 0:11:35
Primeiro, eu gostaria de saber por que o senhor, que é um médico, determinou que a doença da Abigail Williams e da Betty Parris era resultado da mão do diabo?

[William Griggs] – 0:11:46
Veja, eu já cuidei de muita gente aqui na vila. Já vi pessoas tendo surtos, inclusive. Mas eu nunca tinha visto algo assim. Eu fiz testes, olhei a garganta, tirei a temperatura, fiz todos os exames conhecidos pelo homem.

[Natalia Viana] – 0:12:03
E o senhor pode me explicar exatamente o que o senhor viu?

[William Griggs] – 0:12:08
Quando eu cheguei, a Abigail estava de pé, mas ela, de repente, desmoronou no chão, como se estivesse mole. Depois, ela se enrolou no chão sobre si mesma, como um gato. Passou a se contorcer de dor, gritava.

[Natalia Viana] – 0:12:28
Mas ainda assim, me parece que é pouco para o senhor afirmar que havia uma maldição.

[William Griggs] – 0:12:34
O problema é que Parris já tinha me procurado antes. Os sintomas não paravam. E depois de uns dias, começaram a se espalhar para mais garotas.

[Natalia Viana] – 0:12:45
É, eu soube. Mas o que se faz num caso desses?

[William Griggs] – 0:12:49
A única coisa a se fazer é procurar quem é que está jogando esse feitiço. Há uma série de testes que se pode fazer. É preciso prender a mulher suspeita, examinar seu corpo, como se comporta, ou esperar que ela confesse.

[Natalia Viana] – 0:13:08
O senhor diz mulher, né? Mas há homens bruxos também, certo?

[William Griggs] – 0:13:15
Geralmente é mulher. Confie em mim. Eu sou um homem racional, um médico. Todo conhecimento que eu sei foi obtido com estudos, com observação. Está mais do que provado.

[Natalia Viana] – 0:13:33
Na nossa entrevista, William Griggs disse que o mal se espalhou para outras meninas. E ele não tava exagerando. Na verdade, algumas semanas depois, o mal chegaria à família do médico. No dia 27 de fevereiro de 1692, a jovem Elizabeth Hubbard, de 17 anos, sua sobrinha, estava voltando para casa no meio da noite.

[Natalia Viana] – 0:14:05
Estava escuro. Lembre-se que a eletricidade, só seria inventada dali a 200 anos. E o caminho estava coberto de neve no inverno mais gelado em décadas. Foi quando ela teve a sensação de estar sendo seguida. Olhou para trás algumas vezes e não viu nada. Seguiu caminhando e quando estava muito perto da soleira da sua porta, viu que estava sendo seguida por um lobo. Era um lobo grande, negro. E quando ela chegou em casa assustada, contou que o lobo era servo de uma pedinte que vivia na cidade, chamada Sarah Good. Já já voltaremos a ela.

[Natalia Viana] – 0:14:48
Do outro lado da cidade, naquele mesmo dia, Annie Putnam Jr., filha de Thomas Putnam, que por sua vez era neto de um dos fundadores de Salém, de uma das famílias mais ricas e mais conservadoras, também começou a sofrer os sintomas. De repente, sem aviso, ela tinha convulsões e se contorcia, atirando-se no chão.

[Natalia Viana] – 0:15:11
O desespero tomou conta dos homens nobres da vila, que decidiram ir até Boston para pedir que a justiça cuidasse do caso. Não era a primeira, nem a última vez que haveria julgamentos contra bruxas na colônia. Mas dessa vez foi muito rápido. Conseguiram uma audiência com dois juízes, que na época eram os mais prósperos dentre homens brancos. E contaram o que havia acontecido. Os juízes John Hathorne e Jonathan Corwin decidiram ir à vila de Salem no dia seguinte. Emitiram um mandado de prisão contra três mulheres. E mandaram dois guardas, ou milicianos, para realizar as detenções.

[Natalia Viana] – 0:15:50
Todos sabiam que as bruxas tavam soltas e era preciso detê-las. Agora, como esses homens sabiam quem deveriam prender?

[Natalia Viana] – 0:16:00
Para entender isso, vamos ter que voltar alguns dias para a casa do pastor Samuel Parris. Ele e sua esposa tinham viajado para uma reunião de ministros puritanos no dia 25 de fevereiro de 1692. Mas, enquanto isso, na sua casa, a preocupação também crescia. E levou a uma atitude que podemos pensar como desesperada. Sua vizinha, Mary Sibley, ficou encarregada de cuidar das meninas adoentadas. E exasperada de ouvir tantos gritos e contorções, decidiu agir. Chamou a escravizada, a indígena Tituba, e o seu marido, John Indian, e ordenou que ajudassem a fazer o que era conhecido como um bolo de bruxa. Algo que ela tinha aprendido ainda na Inglaterra, antes de pegar o barco para o Novo Mundo.

[Natalia Viana] – 0:16:48
A simpatia era chamada “bolo de bruxa”. Mas, na verdade, era uma receita para se livrar de um feitiço. Uma coisa muito comum na época em que demônios e lobos enfeitiçados andavam por aí. O equivalente a tomar um banho de sal grosso.

[Natalia Viana] – 0:17:03
Então, Tituba e John Indian, escravizados que eram, obedeceram. John coletou a urina das meninas e misturou o líquido com farinha para formar uma massa. Depois, os dois moldaram a massa como se fossem biscoitos e assaram no forno à lenha. Seguindo ordens da vizinha, em seguida, eles deram os biscoitos de comer para o cachorro da família.

[Natalia Viana] – 0:17:31
A simpatia é estranha para nós hoje, mas é o que ocorreu. Tudo isso está relatado em documentos da época. Então, não vamos brigar com os fatos. O objetivo, eu imagino, seria passar os tormentos das meninas para o cachorro. Só que ocorreu o contrário. Os surtos ficaram mais violentos e fortes. E quando Samuel Parris chegou da viagem junto com outros ministros puritanos, a cena era assombrosa. Assustou a todos eles. E logo seria descrito em suas casas e nas suas igrejas.

[Natalia Viana] – 0:18:05
A notícia se espalharia como o vento. Como um vídeo viral de TikTok. E quando Samuel Parria perguntou a elas o que estava acontecendo, Abigail e Betty disseram que estavam vendo a sombra de um ser estranho dentro da casa. Elas apontavam para esse espectro que ninguém mais conseguia ver. “De quem é essa sombra?” Perguntou Samuel. E ambas as meninas, assustadas, disseram que era da escravizada Tituba.

[Natalia Viana] – 0:18:34
Foi assim que ele descobriu sobre o bolo de bruxa. O que o deixou simplesmente enfurecido. Afinal, duas mulheres, sem consultá-lo, tinham buscado um remédio popular. Um encanto. Para tratar da sua filha e da sua sobrinha debaixo do seu teto sagrado. E ele chegou a dizer, abre aspas, “que meios diabólicos foram usados com a feitura do bolo pela minha serva indígena’. E por esse meio, o diabo foi levantado contra nós, fecha aspas.

[Natalia Viana] – 0:19:07
O ministro Samuel Parris chamou Tituba para exigir explicações. Mas nós só vamos conseguir entender o que aconteceu nessa conversa depois de muitas águas rolarem. De qualquer forma, para ele uma coisa era clara: Tituba era uma bruxa.

[Natalia Viana] – 0:19:28
Havia outras mulheres que ficaram marcadas como bruxas naqueles dias. A segunda a ser identificada pelas meninas foi Sarah Good, que mencionei agora há pouco. Sarah tinha cerca de 40 anos, uma filhinha de 6 e estava grávida de 3 meses. Ela e o marido William Good tinham perdido sua pequena propriedade por causa de dívidas e viviam de favor. William trocava trabalho por hospedagem e comida, mas quando nem isso chegava, eles dormiam em estábulos, batiam de porta em porta pedindo lenha para aquecer a família. Sarah era tida como desagradável. Ralhava sempre que alguém lhes negava uma caridade. Podemos ouvi-los.

[Natalia Viana] – 0:20:11
Podemos encontrar esses sentimentos nos testemunhos daqueles que as acusaram, como nas palavras de Samuel Abbey, um vizinho que chegou a hospedar a Sarah Good na sua casa no ano de 1690.

[Natalia Viana] – 0:20:25
“Estes depoentes, por caridade, sendo pobres, permitiram que vivessem em sua casa por algum tempo até que a referida Sarah Good se tornou um espírito tão turbulento, maldoso, com uma inclinação tão malévola, que esses depoentes não puderam mais tolerá-la em sua casa e, em busca de paz, foram obrigados a expulsá-la junto com seu marido. Desde então, a referida Sarah Good tem agido com grande maledicência e rancor. No inverno seguinte, começamos a perder gado, vários deles de maneira incomum, em estado debilitado, embora tivessem apetite e comessem. Os depoentes perderam, desta forma, 17 cabeças de gado em dois anos, além de ovelhas e porcos. E ambos acreditam que morreram por feitiçaria.”

[Natalia Viana] – 0:21:21
Outra Sarah, Sarah Osbourne, também foi apontada como uma das bruxas que estavam torturando as meninas sob as sombras da noite.

[Natalia Viana] – 0:21:30
Com base nesses relatos, eles enviaram seus guardas para prender as três mulheres e marcaram uma oitiva para o dia seguinte ali mesmo na vila de Salém, em um dos lugares mais frequentados: a taverna dos Ingersoll.

[Natalia Viana] – 0:21:48
Quando eles chegaram na manhã do dia 1º de março de 1692, os cascos dos seus cavalos alertaram todos os moradores de que já ia começar a audiência. E então uma procissão se formou atrás deles.

[Natalia Viana] – 0:22:02
Para todos, naquela simples vila religiosa, os dois juízes demonstravam serem homens notáveis e, além disso, homens ricos de bens. John Hathorne vestia uma roupa toda preta, com uma corrente de prata e botões de ouro no seu casaco pesado, além de belas botas de couro e jóias nos pulsos.

[Natalia Viana] – 0:22:23
Quando chegaram à taverna, Sarah Good já estava lá, com os pulsos atados por uma corrente e vigiada por um dos guardas. Seu marido e sua filhinha de seis anos também tavam com ela. Mas a multidão era tanta que não cabiam na taverna. E então os juízes decidiram fazer audiência no centro comunitário, onde todos os domingos o pastor Samuel Parris dava os seus sermões.

[Natalia Viana] – 0:23:03
Foi ali, naquela casa de madeira escura, medindo cerca de 100 metros quadrados, que entraram os juízes, as três meninas adoentadas, os homens que as representavam, seus pais e tios, e as três acusadas. O resto da comunidade se apertava de pé nos cantos do salão. A luz que entrava pelas janelas era pouca, e a neve e o clima terrivelmente gelado faziam com que nenhum zunido ou grunhido de animal se ouvisse lá fora. Quando John Hathorne começou a presidir a sessão, o silêncio era sepulcral.

[Natalia Viana] – 0:23:47
Ainda hoje, uma casa parecida está erguida no centro antigo de Salém. É dali que saem os tours, que relembram aquele dia fatídico. Eu visitei a área com a minha colega, a jornalista Giulia Afiune, em 2023.

[Sean O’Brien] – 0:24:04
But folks, that is actually our surprise intro.

[Natalia Viana] – 0:24:38
Agora já tamo caminhando em volta desse prédio, que é, de novo, é o Town Hall é uma reconstrução que parece como eram as construções na época, só que é de tijolinhos vermelhos aquele estilo bem britânico.

[Natalia Viana] – 0:24:38
Já vem mais um, mais um tour, tem uns… uns cinco tours que começaram só nos últimos 10 minutos.

[Giulia Afiune] – 0:24:38
Sim, agora que parou de chover está bombando de tours aqui.

[Natalia Viana] – 0:24:38
Sim, e está bombando de gente, né? Aumentou muito a quantidade de gente na rua.

[Sean O’Brien] – 0:24:38
Mas essa é a coisa. Sim, se falarmos de bruxaria, é algo bem relevante. Você está no Wich City Walking Tours. Mas veja uma coisa, alerta de spoiler. Toda a nossa história de bruxaria aqui em Salém, do começo ao final, durou um total de 13 meses. Só isso. Então a cidade tem 400 anos. E nós colocamos toda a ênfase no pior ano já registrado em toda a nossa história.

[Natalia Viana] – 0:25:02
Este é o Sean O ‘Brien, nosso guia em Salém e historiador. Que você conheceu no primeiro episódio. E a voz dele foi traduzida para o português com a ajuda de inteligência artificial.

[Natalia Viana] – 0:25:16
Foi, de fato, um ano terrível. Quem esperava que aquela audiência seria o fim da maldição tava muito enganado. O questionamento seguiu um roteiro já pré-determinado pelos juízes. De maneira a dar um ar solene e quase científico à exposição. Todas as acusadas, uma depois da outra, tiveram que responder às mesmas perguntas. Há uma enorme quantidade de documentos manuscritos que relatam como foi.

[Natalia Viana] – 0:25:45
A primeira a entrar e encarar os juízes foi Sarah Good.

[John Hathorne] – 0:26:17
Sarah Good, com que espírito maligno você tem familiaridade?

[Sarah Good] – 0:26:22
Nenhum.

[John Hathorne] – 0:26:23
Você teve contato com o diabo?

[Sarah Good] – 0:26:25
Não.

[John Hathorne] – 0:26:26
Por que você machuca essas crianças?

[Sarah Good] – 0:26:35
Eu não as machuco. Nego essa acusação.

[John Hathorne] – 0:26:38
Quem então você está dizendo que faz isso?

[Sarah Good] – 0:26:42
Não acuso ninguém.

[John Hathorne] – 0:26:43
Que criatura você acusa?

[Sarah Good] – 0:26:46
Nenhuma criatura. Mas eu sou acusada falsamente.

[John Hathorne] – 0:26:50
Por que você saiu murmurando da casa de Samuel Parris?

[Sarah Good] – 0:26:54
Não murmurei. Eu o agradeci pelo que deu à minha filha.

[John Hathorne] – 0:27:00
Você não fez contato com o diabo?

[Sarah Good] – 0:27:02
Não.

[Natalia Viana] – 0:27:05
Neste momento, Hathorne olha para as meninas, as três afligidas, sentadas em um banco de madeira, e pede a elas: “Olhem para ela. É essa a pessoa que as machuca?”

[Natalia Viana] – 0:27:17
A cena a seguir é assustadora. Quando elas olham para Sarah Good, as três se atiram no chão, começam a se contorcer e a gritar de dor. Os adultos correm para socorrê-las. Pela primeira vez, toda a cidade vê a maldição acontecer ali, diante dos seus olhos.

[John Hathorne] – 0:27:38
Você não vê o que fez? Por que não nos diz a verdade? Por que não diz a verdade? Por que você atormenta essas crianças?

[Sarah Good] – 0:27:46
Eu não as atormento.

[John Hathorne] – 0:27:48
Quem você acusa?

[Sarah Good] – 0:27:49
Ninguém.

[Natalia Viana] – 0:27:52
Os moradores estão apavorados e ninguém acredita na Sarah Good. A cena ficou marcada na memória coletiva dos moradores de Salém. Tanto que existem dezenas de quadros retratando esse exato momento. Um deles, de 1855, está à mostra no Museu da Cidade de Salem, que eu consegui visitar em 2023.

[Natalia Viana] – 0:28:16
Hoje é dia 30 de outubro, segunda-feira, véspera de Halloween. Eu ainda estou um pouco rouca, porque ainda está muito frio. Espero que melhore até amanhã, que é o grande dia. Mas eu estou indo hoje, nessa hora, cedinho, nessa hora da manhã, me encontrar com a Kristen, que é assessora de imprensa do Museu Peabody Essex Museum, aquele mesmo que é o museu que tem os documentos originais do julgamento das bruxas de Salém.

[Natalia Viana] – 0:28:56
Hello. I’m here to meet Kristen.

[Natalia Viana] – 0:28:57
Cheguei na entrada e fui recebida pela assessora de imprensa Kristen.

[Natalia Viana] – 0:29:01
Kristen, hello!

[Natalia Viana] – 0:29:03
Ela me levou a uma das salas de exposição. Nela, objetos da época, como móveis de madeira, cartas, utensílios de cozinha, são exibidos ao visitante. Paramos diante de uma enorme tela a óleo. Era a pintura do julgamento.

[Natalia Viana] – 0:29:22
Mas é um quadro que é pintado a óleo em 1855, recriando um pouco a situação que acontecia ali nos julgamentos. Então, você tem as meninas se atirando no chão, tendo convulsões. Você tem os escribas ali sentados um pouquinho abaixo e os juízes acima, paramentados como juízes, né? Obviamente, sendo ingleses, eles se importavam muito com esse tipo de vestimento. Eles estão de preto, com um chapéu preto também. O escriba escrevendo tudo à mão, que são esses documentos que a gente tem hoje. E você tem, assim, uma convulsão na corte, a pessoa que é acusada se rebelando, e as meninas, enfim, sofrendo seus ataques ali no chão.

[Natalia Viana] – 0:30:09
No salão de madeira, a tensão crescia. O juiz Hathorne, impávido, dava sinais que não ia desistir de questionar a acusada. Ele pergunta para Sarah Good.

[John Hathorne] – 0:30:21
Então, como essas crianças foram atormentadas?

[Sarah Good] – 0:30:24
Só sei que você trouxe outras mulheres comigo e agora me acusa.

[John Hathorne] – 0:30:28
Quem?

[Sarah Good] – 0:30:29
Uma das que você trouxe comigo para a casa de reuniões.

[John Hathorne] – 0:30:34
Trouxemos você para cá.

[Sarah Good] – 0:30:36
Sim, e mais duas.

[John Hathorne] – 0:30:39
Quem então atormenta as crianças?

[Sarah Good] – 0:30:43
Sarah Osbourne.

[Natalia Viana] – 0:30:52
Sarah Good acusa Sarah Osbourne, que a essa altura já aguardava sua vez, vigiada de perto pelo guarda. E quando ela diz isso, é como se um milagre repousasse sobre a sala. O corpo das três meninas relaxa. Elas param de se contorcer, e respiram aliviadas. Todos seguem atentos.

[John Hathorne] – 0:31:16
O que você murmura quando vai à casa das pessoas?

[Sarah Good] – 0:31:20
É um salmo.

[John Hathorne] – 0:31:22
A quem você serve?

[Sarah Good] – 0:31:24
Eu sirvo a Deus.

[John Hathorne] – 0:31:27
Que Deus você serve?

[Sarah Good] – 0:31:29
O Deus que fez a terra e o céu.

[Natalia Viana] – 0:31:37
Sarah pode ter colocado a culpa em outra mulher, mas ela não seria digna de pena dos homens que conduziam aquele espetáculo. E nem do seu próprio homem.

[Natalia Viana] – 0:31:47
Antes de liberá-la, o juiz Hathorne traz uma testemunha insuspeita. O seu marido, William Good. E a ele faz apenas uma pergunta: “É verdade que você disse que sua esposa ou era bruxa, ou se tornaria uma?” A frase dita para um amigo havia rodado no boca a boca e virado uma fofoca enorme no vilarejo. No começo, William até tentou negar.

[William Good] – 0:32:13
Não. Não.

[John Hathorne] – 0:32:17
Você já viu ela praticando alguma coisa?

[William Good] – 0:32:21
Não. Não dessa natureza.

[John Hathorne] – 0:32:23
Hum. Prossiga.

[William Good] – 0:32:27
Ela é ruim comigo. Se porta mal. E quero dizer com lágrimas nos meus olhos. Essa mulher é inimiga de todo o bem.

[Natalia Viana] – 0:32:39
“Minha mulher é inimiga de todo o bem.” O equivalente a jogar sua própria esposa na fogueira. Surpresa na plateia e depois silêncio. Terminou assim o interrogatório da primeira acusada. Mas aquela seria uma longa tarde.

[Natalia Viana] – 0:33:00
Sarah Osbourne, a segunda suspeita, teve que responder às mesmas perguntas e da mesma maneira negou. “A Sarah Good afirmou que é você que infere as meninas”, disse o juiz. “Eu não sei se o diabo usa a minha forma para fazer algum mal”, respondeu ela.

[Natalia Viana] – 0:33:15
Assim como antes, o juiz pediu para olharem a acusada e as três meninas caíram no chão, torturadas por agulhas invisíveis. Uma delas se aproximou dos juízes e fez uma declaração que eu vou ler aqui.

[Natalia Viana] – 0:33:30
“Deposição de Elizabeth Hubburd, de 17 anos de idade, que testemunhou e afirmou que no dia 27 de fevereiro de 1692: ‘eu vi a aparição de Sarah Osbourne, que me torturou muito gravemente, ao me espetar e beliscar violentamente. E então continuou a me machucar gravemente até o 1º de março e depois também me afetou e me ordenou que escrevesse em seu livro’.”

[Natalia Viana] – 0:33:57
Lembre-se disso.

[Natalia Viana] – 0:34:00
Acusada de ser bruxa, Sarah Osbourne teria insistido, em meio a torturas indeclaráveis, que a menina aflita assinasse o seu livro.

[Natalia Viana] – 0:34:09
Vamos entender mais pra frente que livro era esse. Mas vale lembrar que naquela época os livros eram ainda artigos raros, objetos preciosos, difíceis de reproduzir e que guardavam ensinamentos e verdades como se fossem mágicos. O juiz Hathorne perguntou então se ela mesma já tinha visto uma aparição.

[Natalia Viana] – 0:34:29
“Eu estava com medo, porque uma vez, quando dormia, vi uma figura como um índio, todo de negro, que me agarrou pelo cabelo e me levou até a porta da minha casa.”

[Natalia Viana] – 0:34:39
Ou seja, ela admitiu ter visto a figura de um indígena, uma figura ameaçadora para ela, sombria, que a tinha arrastado pelos cabelos. Era uma figura parecida com a terceira acusada que viria depois dela, Tituba, a única acusada de bruxaria que não era dali. Não era inglesa e nem branca. Era indígena Arawak, mais baixa do que todos ali, e sua pele escura também era diferente. Seus olhos eram menores, rasgados, o rosto redondo e a boca larga, com cabelos negros e grossos escorrendo pelos ombros. Era a vez de Tituba ser questionada.

[Natalia Viana] – 0:35:20
Tudo começou como as duas acusadas anteriores.

[John Hathorne] – 0:35:33
Silêncio! Silêncio! Com que espírito maligno você tem familiaridade?

[Tituba] – 0:35:47
Nenhum.

[John Hathorne] – 0:35:48
Porque você machuca essas crianças?

[Tituba] – 0:35:50
Eu não machuco.

[John Hathorne] – 0:35:51
Quem as machuca?

[Tituba] – 0:35:53
O diabo, que eu saiba.

[Natalia Viana] – 0:35:55
Mas Tituba decide, num lampejo de genialidade ou de loucura, mudar o ritmo e o rumo da história.

[John Hathorne] – 0:36:02
Você viu o diabo?

[Tituba] – 0:36:05
O diabo veio até mim e me pediu pra servi-lo.

[John Hathorne] – 0:36:08
Quem mais você viu?

[Tituba] – 0:36:09
Quatro mulheres. E elas, às vezes, machucam as crianças.

[John Hathorne] – 0:36:13
Quem são elas?

[Tituba] – 0:36:16
Sarah Good e Sarah Osbourne. E não sei quem são as outras. A Sarah Good e a Sarah Osbourne me fizeram machucar as crianças, mas eu não vi as outras. Havia também um homem alto, de Boston.

[John Hathorne] – 0:36:28
Quando você os viu?

[Tituba] – 0:36:30
Ontem à noite, em Boston.

[John Hathorne] – 0:36:31
O que eles disseram pra você?

[Tituba] – 0:36:33
Machuque as crianças.

[Natalia Viana] – 0:36:35
As meninas, que tinham surtos intercalados, se acalmaram ao ouvir a confissão. Se tudo isso tá parecendo um pouco delirante pra você, saiba: isso tudo aconteceu. Quer dizer, isso tudo tá registrado em documentos históricos que eu revi cuidadosamente pra compor essa tradução pro português. Há pelo menos três descrições de próprio punho dessa mesma cena. Confia. A cena segue:

[John Hathorne] – 0:37:02
E você as machucou?

[Tituba] – 0:37:04
Não. Não. Havia quatro mulheres e um homem. E eles machucaram as crianças. E depois me disseram que se eu não as ferisse, eles iam me machucar.

[John Hathorne] – 0:37:13
Mas você não as feriu?

[Tituba] – 0:37:14
Sim. Mas eu não vou mais feri-las.

[John Hathorne] – 0:37:17
Você se arrepende?

[Tituba] – 0:37:18
Sim.

[John Hathorne] – 0:37:19
E por que você as machucou?

[Tituba] – 0:37:20
Eles disseram, machuque as crianças ou vamos fazer pior com você.

[John Hathorne] – 0:37:24
Mas você viu o quê? Um homem veio a você e disse: “sirva a mim?” Qual que era o serviço?

[Tituba] – 0:37:28
Machucar as crianças. E ontem à noite havia uma aparição. Uma aparição que me disse, mate as crianças. E se eu não as machucasse, ele faria pior comigo.

[John Hathorne] – 0:37:38
O que é a aparição que você vê?

[Tituba] – 0:37:42
Às vezes. Às vezes é como um porco. E às vezes como um grande cachorro. Foram quatro vezes que eu vi essa aparição.

[John Hathorne] – 0:37:50
O que ele disse a você?

[Tituba] – 0:37:52
O cachorro preto disse: “sirva-me”. Mas eu falei: “eu tenho medo”. E ele falou: “se você não me servir, eu vou fazer pior com você”.

[John Hathorne] – 0:38:01
O que você respondeu?

[Tituba] – 0:38:02
“Eu não vou mais te servir.” Então ele disse que iria me ferir. Depois ele apareceu com um homem e ameaçou me machucar. Esse homem tinha um pássaro amarelo que ficava com ele. E me disse que tinha objetos bonitos que ele ia me dar se eu servisse a ele.

[Natalia Viana] – 0:38:18
Imagino Tituba a essa altura mantendo o olhar firme enquanto a plateia acompanha sua voz atentamente. As cenas são claras, os diálogos são contados em detalhes. Tituba tem pelo menos o dom de enfeitiçar pela sua narrativa. É como uma Sherazade das 1001 noites. Só que essa é uma mulher de verdade. Uma figura histórica.

[John Hathorne] – 0:38:40
O que eram esses objetos bonitos?

[Tituba] – 0:38:44
Ele não mostrou.

[John Hathorne] – 0:38:45
O que mais você viu?

[Tituba] – 0:38:46
Dois gatos. Um gato vermelho e um negro.

[John Hathorne] – 0:38:50
O que eles disseram?

[John Hathorne] – 0:38:52
“Sirva-me.”

[John Hathorne] – 0:38:53
Qual serviço era esse?

[Tituba] – 0:38:55
Machuque as crianças.

[John Hathorne] – 0:38:56
Você não beliscou Elizabeth Hubbard essa manhã?

[Tituba] – 0:38:59
O homem a trouxe até mim e me fez beliscar ela.

[John Hathorne] – 0:39:02
Mas por que você foi até a casa de Thomas Putnam ontem à noite e machucou a criança?

[Tituba] – 0:39:06
Eles me agarraram, me empurraram e me fizeram ir lá.

[John Hathorne] – 0:39:08
E o que você tinha que fazer?

[Tituba] – 0:39:10
Matá-la com uma faca.

[Natalia Viana] – 0:39:17
Aqui chegamos a um ponto crucial da confissão de Tituba. Um que reverbera símbolos que até hoje preenchem nossos pesadelos. E nossas fantasias. E que não por acaso já apareciam listados lá no Malleus Maleficarum.

[John Hathorne] – 0:39:36
Silêncio! Silêncio! Como você chegou lá?

[Tituba] – 0:39:41
Eu voei em cima de um cabo de madeira e Sarah Good e Sarah Osbourne estavam atrás de mim. Nós voamos segurando umas nas outras.

[John Hathorne] – 0:39:49
Você voou por entre as árvores ou sobre elas?

[Tituba] – 0:39:52
Eu não sei. Eu não sei como nós chegamos. Eu não vi as árvores nem caminho de terra. Mas eu estava lá presente quando estávamos lá em cima.

[Natalia Viana] – 0:40:00
Está escutando? A Tituba diz que ela e as demais bruxas voam em pedaços de madeira. Como as vassouras de bruxa. A plateia segue em silêncio vidrada.

[John Hathorne] – 0:40:10
Por que você não disse isso ao seu mestre?

[Tituba] – 0:40:12
Eu estava com medo. Porque eles falaram que iam cortar a minha cabeça se eu contasse.

[John Hathorne] – 0:40:17
Que ajudantes tinha Sarah Good?

[Tituba] – 0:40:19
Ela tinha um pássaro amarelo que mamava entre os seus dedos. Eu mesma vi o pássaro mamar entre o dedo indicador e o dedo médio da sua mão direita.

[John Hathorne] – 0:40:27
Você nunca praticou bruxaria no seu próprio país?

[Tituba] – 0:40:31
Não. Não. Nunca.

[John Hathorne] – 0:40:34
Até agora. O que tinha Sarah Osbourne?

[Tituba] – 0:40:37
Ontem ela tinha uma criatura. Era uma coisa, era uma coisa com uma cabeça de mulher e duas pernas e asas.

[Natalia Viana] – 0:40:45
O silêncio é interrompido pelo grito de Abigail Williams. Que diz ter visto essa mesma criatura com a senhora Osbourne. E que ela depois teria se transformado na forma de uma bruxa.

[John Hathorne] – 0:40:55
O que mais você viu com a senhora Osbourne?

[Tituba] – 0:41:00
Uma outra criatura peluda. Um rosto peludo e um nariz longo. Eu não sei descrever como é a cara dele, mas ele tinha duas pernas e ficava de pé como um homem. E ontem à noite ele tava de pé do lado da lareira da casa do senhor Parris.

[John Hathorne] – 0:41:15
Você viu a Sarah Good machucando Elizabeth Hubbard no sábado passado?

[Tituba] – 0:41:19
Eu vi que ela soltou um lobo sobre Elizabeth.

[John Hathorne] – 0:41:22
E havia uma mulher?

[Tituba] – 0:41:23
Com um capuz negro sobre outro capuz branco de seda. E um nó na ponta. Eu não sei que mulher era aquela, mas eu a vi em Boston quando eu morava lá.

[Natalia Viana] – 0:41:33
Nesse momento as meninas caem no chão e começam a se contorcer.

[John Hathorne] – 0:41:38
Você a vê torturando as crianças agora?

[Tituba] – 0:41:40
Vejo. Vejo sim. É Sarah Good. E ela as atormenta na sua própria forma. E quem é que as atormenta agora? Agora eu não consigo ver. Eu estou cega. Eu não posso mais ver.

[Natalia Viana] – 0:41:59
Cega, Tituba não podia mais ver o mundo espectral onde ela e as outras bruxas voavam sobre as árvores e onde feriam crianças inocentes. Foi como se uma cortina tivesse caído sobre o espetáculo que ela oferecia à plateia. Terminou assim, de maneira abrupta, o primeiro dia de interrogatórios, segundo os documentos a que temos acesso hoje.

[Natalia Viana] – 0:42:21
E o que se descobriu era aterrorizante. Não havia apenas aquelas três bruxas na cidade, aquelas que já estavam presas. Havia pelo menos outras bruxas e um homem alto, vestido de negro, talvez o próprio diabo andando por aí. Tinha ainda animais encantados, pássaros amarelos, gatos vermelhos e cães enormes, negros, que obedeciam as ordens das bruxas.

[Natalia Viana] – 0:42:45
E você percebeu a menção a um livro do diabo? Aí voltamos ao papel fundamental de livros como o Malleus Maleficarum, que eu falei no começo desse episódio. Escrito duzentos anos antes, o Malleus já descrevia que as bruxas se transformavam em diferentes formas de animais ou enviavam ilusões demônicas em formato de animais, em especial de gatos, para fazerem o mal no seu lugar. Aquelas imagens fixadas pelo livro já faziam parte do inconsciente coletivo.

[Natalia Viana] – 0:43:18
Tituba iria ainda confirmar diante dos juízes a importância de outro livro, o livro do diabo. Seu depoimento seguiu no dia seguinte, quando o juiz a entrevistou na cela acorrentada. E então ela contou tudo o que sabia, ou o que podia inventar. Disse que foi visitada por um homem alto, vestido de negro e vindo de Boston, o próprio demônio.

[John Hathorne] – 0:43:42
Ele te pediu para servi-lo?

[Tituba] – 0:43:44
Sim, ele me pediu para servi-lo por seis anos e voltou e me mostrou um livro.

[John Hathorne] – 0:43:51
Que livro? Pequeno ou grande?

[Tituba] – 0:43:52
Ele não me mostrou, mas eu vi, estava no seu bolso.

[John Hathorne] – 0:43:55
E o que ele disse que você devia fazer naquele livro?

[Tituba] – 0:43:57
Ele falou: “escreva e ponha o seu nome nele”.

[John Hathorne] – 0:44:01
E você escreveu?

[Tituba] – 0:44:01
Sim, uma vez eu fiz uma marca no livro, uma marca com tinta vermelha, vermelha como sangue.

[John Hathorne] – 0:44:08
E ele tirou essa tinta do seu corpo?

[Tituba] – 0:44:10
Não, não, mas ele me disse que iria tirar do meu corpo da próxima vez.

[John Hathorne] – 0:44:14
Você viu outras marcas nesse livro?

[Tituba] – 0:44:16
Muitas outras, algumas em vermelho, outras em amarelo. Ele abriu o livro e me mostrou muitas marcas.

[John Hathorne] – 0:44:22
Que nomes estavam no livro?

[Tituba] – 0:44:24
Estavam de Sarah Good e Sarah Osbourne. E haviam outras marcas, haviam muitos outros nomes que eu não consegui ler.

[John Hathorne] – 0:44:31
Quantas?

[Tituba] – 0:44:32
Havia nove marcas.

[Natalia Viana] – 0:44:36
A acusação de Tituba era grave. Nove bruxas desconhecidas haviam assinado o livro do diabo e estavam livres por Salém. A Caça às Bruxas estava apenas começando.

[Natalia Viana] – 0:44:50
Por hoje é só.

[Natalia Viana] – 0:45:08
Mas a história da Caça às Bruxas continua na próxima semana. Enquanto isso, visite o nosso site e mergulhe nos registros históricos desses eventos aterrorizantes. Vai lá: apublica.org

[Natalia Viana] – 0:45:24
O nosso trabalho só é possível porque nós temos apoiadores que ajudam a manter a Agência Pública. Torne-se um apoiador! apoie.apublica.org

[Natalia Viana] – 0:45:34
Caça às Bruxas é uma produção original da Agência Pública de Jornalismo Investigativo. Esse podcast foi dirigido por mim, Natalia Viana. Eu fiz a pesquisa histórica e a reportagem em colaboração com a Giulia Afiune, que também captou os áudios em Salém. Eu também escrevi os roteiros dos episódios com a colaboração da Sofia Amaral.

[Natalia Viana] – 0:45:55
A Sofia Amaral também coordenou a produção da série, com apoio da Stela Diogo e da Rafaela de Oliveira. Tanto a narração quanto as cenas de dramaturgia foram gravadas no estúdio da Agência Pública, com trabalhos técnicos de Stela Diogo e Ricardo Terto. A Mika Lins fez a direção de narração e de dramaturgia.

[Natalia Viana] – 0:46:15
O desenho de som foi feito por Ricardo Terto, que também fez a edição e finalização dos episódios. A trilha sonora original é de Paulo Sartori, com trilhas adicionais do Epidemic Sound. A identidade visual é do Matheus Pigozzi.

[Natalia Viana] – 0:46:30
Nesse episódio, tivemos, em ordem de aparição, Marco Antônio Pâmio como doutor William Griggs, Marcelo Marothy como juiz John Hathorne, Agnes Zuliani como Sarah Good, Diego Machado como William Good e Mika Lins como Tituba.

[Natalia Viana] – 0:46:47
Registro aqui nossos agradecimentos a Lucretia Slaughter; a Witch City Walking Tours, que liberou o nosso tour com o Sean em Salem; ao Peabody Essex Museum; a Phillips Library; e a todas as mulheres que morreram como bruxas, e às suas filhas, netas e descendentes. Sua memória não será esquecida.

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