Há pouco mais de um ano, proprietários de apartamentos do Riviera Park Hotel, em Caldas Novas, começaram a travar batalhas judiciais com a empresa administradora do local, a WAM Riviera Administração Hoteleira.
Após longas disputas, as brigas entre as duas partes pareciam estar se encaminhando para uma resolução depois da realização da Assembleia Geral Extraordinária (AGE), mas acabou em mais um capítulo da série de conflitos na Justiça entre os lados.
A AGE ocorreu no dia 25 de novembro. Ao todo, 400 proprietários participaram e aproximadamente 94% dos participantes votaram a favor da destituição da atual empresa. Foram 375 votos favoráveis e 25 desfavoráveis quanto à remoção da atual administradora-síndica do hotel. No entanto, a Justiça goiana jogou um balde de água fria no desejo dos donos dos imóveis e suspendeu os efeitos da AGE.
Segundo a WAM, o resultado só foi possível “mediante a inclusão de votos inválidos, provenientes de unidades inadimplentes, multadas ou sem representação regular”. Além disso, a empresa desconsiderou, de forma arbitrária, “votos regulares que não eram de seu interesse” dos proprietários integrantes do pool pirata.
Marcação da AGE também envolveu a Justiça
- Inicialmente, ela aconteceria no dia 17 de novembro. Houve, inclusive, uma decisão da Justiça reconhecendo a legitimidade dos condôminos e autorização da AGE, até o início da tarde de 14 de novembro.
- No mesmo dia, horas depois, durante o plantão judicial, um novo desembargador suspendeu a assembleia, acolhendo o pedido da administradora.
- Entretanto, no dia 18 de novembro, a desembargadora preventa para julgar recursos envolvendo as partes revogou a liminar em plantão para realização da AGE, que ocorreu no dia 25 de novembro.
A votação resultaria no desligamento da WAM da gestão do Riviera e na eleição da Atlantica Hospitality International como nova administradora hoteleira do local. Em nota, à época do resultado da votação, a WAM alegou que a AGE era “inválida” e apresentou problemas formais que “comprometeram sua legitimidade”.
Diante do cenário, a WAM afirmou que todos os atos seriam submetidos à Justiça e, na noite de sexta-feira (28/11), após recorrer à decisão, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) estabeleceu uma liminar que suspendia o resultado da votação.
Segundo a desembargadora do processo, a convocação da assembleia ocorreu em um prazo insuficiente e não garantiu a participação adequada dos condôminos.
A justificativa dita em sentença foi que, no dia 19 de novembro, logo após a regularidade da AGE, foi realizada uma comunicação a respeito da convocação dos condôminos para a assembleia. Contudo, o período dessa notificação resultaria em um prazo de seis dias antes da AGE e de apenas dois dias úteis de antecedência, visto que a data antecedia um fim de semana.
Para a magistrada, esse período da convocação seria “incapaz” de assegurar que os 788 condôminos, muitos residentes fora da cidade e até fora do país, tivessem tempo hábil para tomar conhecimento e comparecer.
A desembargadora destacou também que sua decisão anterior, em que havia autorizado a realização de uma assembleia em 17 de novembro, não servia como autorização para quaisquer novas convocações.
Naquela ocasião, segundo a magistrada, a assembleia foi considerada regular porque havia sido convocada dentro do prazo de 30 dias e com a devida publicidade. No caso da AGE de 25 de novembro, no entanto, não foram apresentados motivos urgentes que justificassem a redução drástica do prazo.
A liminar também impede a convocação de novas assembleias com a mesma pauta que envolve a destituição da empresa, seja presencial ou virtual, até que o mérito do processo seja analisado e julgado. A decisão cabe recurso, que será feito de acordo com o Conselho Consultivo e Fiscal dos proprietários.
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Votação da AGE
Segundo relatos de participantes presentes na assembleia, a sessão teve início próximo das 9h30 de terça (25) e foi finalizada perto da 1h40 de quarta-feira (26/11). Após 16 horas, com momentos de debates acalorados, manifestações e votações sucessivas, a AGE teve um desfecho da votação.
Para alguns proprietários, a AGE se tratou de um momento “histórico” e “importante”. Segundo eles, o que teria caracterizado esse acontecimento, além do resultado da votação, foi a participação de três condôminos que residem fora do Brasil e a participação ativa de um proprietário que, enquanto acompanhava seu pai internado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), optou permanecer conectado até o desfecho final, fazendo questão de registrar sua presença.
Uma das proprietárias que reside fora do Brasil acompanhou toda a votação da Espanha. Ela contou ao Metrópoles que participou mesmo sem poder votar “porque a empresa não teria encaminhado o boleto correto para que ela efetuasse o pagamento do condomínio”.
“Eles me encaminharam um boleto que tinha só um ’embleminha’, que é a data e diz Riviera. Mas nele não é especificado todo o condomínio. Eu então não paguei porque queria que me enviassem corretamente e depois deixaram de me mandar. Eles fizeram essa ‘manha’ para que eu não pudesse votar”, relatou a proprietária.
O sentimento de “decepção”, “falta de educação” e “experiência ruim” também foi destacado pela proprietária, muito por conta da forma da “gestão da administração”, após a votação. O mesmo motivo também foi ressaltado por um proprietário que reside na Finlândia.
Ele conta que, desde que comprou o imóvel, o valor dele só desvalorizou, causando prejuízo financeiro não somente a ele, mas a outros proprietários, por conta da “má administração da empresa no local”. À época, o resultado da AGE era de “alívio”.
“Eu moro na Finlândia há 15 anos. Eles nunca acatavam nada e não deixavam a gente fazer nossa assembleia. Sempre tumultuavam e foi isso que eles tentaram fazer nessa última também. Mas graças a Deus, depois de muito tempo de luta, a gente conseguiu na justiça para que a gente tivesse a oportunidade de ter a AGE e destituí-los”, contou.
Para um proprietário residente na Itália, a decisão tinha se tratado de uma “vitória” de todos os que se uniram para realizar a votação na AGE. “Não tenho palavras para definir esta equipe. Sem eles, com certeza teria perdido todos os apartamentos que tenho no Brasil”, ressaltou.
Já para a WAM, a “alegada vitória” foi carregada de motivações políticas que teriam o intuito de “tumultuar e manipular a opinião pública”.
“A AGE é inválida, pois nem sequer houve convocação regular. Ainda que houvesse, pelos critérios legais — que excluem votos de unidades inadimplentes, multadas ou com procurações vencidas, o que é vedado pela convenção — a gestão obteve maioria clara entre os votos válidos”, explicou em nota.
A empresa havia afirmado que, diante do “ambiente de tumultos”, o “caminho judicial” era a única forma de restabelecer a segurança jurídica e proteger os condôminos que zelam pelo empreendimento. E que, com a decisão da liminar, a WAM a Justiça “salvou” o condomínio.
“A decisão reconheceu a abusividade das iniciativas promovidas por grupo paralelo e não autorizado que vinha tentando, de forma irregular, usurpar a gestão do maior empreendimento hoteleiro de Caldas Novas”, acrescentou.
Mas, afinal, o que ocasionou o início das brigas judiciais?
Segundo relatos de proprietários de apartamentos do hotel, uma decisão da administradora-síndica do local teria alterado a liberdade de escolha dos condôminos em relação ao aluguel do imóvel, em que eles estariam impedidos de definir por conta própria o aluguel de sua propriedade e obrigados a entrarem no sistema pool da empresa.
A empresa WAM negou as acusações de proibições das locações de unidades pelos proprietários e ressaltou que o que veda expressamente é a exploração hoteleira paralela e irregular, conhecida como pool paralelo. A administradora afirmou, em nota, que apenas cumpre a convenção e as “60 decisões judiciais que veda expressamente a exploração hoteleira paralela e irregular”, identificado pela WAM como pool paralelo.
Foi então que as brigas judiciais se iniciaram e, em virtude dessa situação, condôminos se reuniram e elegeram o Conselho Consultivo e Fiscal para tratar tentativas de negociação com a empresa sobre a decisão.
Contudo, desde então, apenas mais brigas foram ocorrendo sem ter nenhum acordo entre as partes. Somado a isso, os proprietários passaram a também alegar má administração da empresa e acabou por se tornar o motivo principal entre os proprietários para uma destituição da empresa no hotel.
Em nota, a WAM afirma que a narrativa de “má administração” não corresponde aos fatos e que o grupo passou a “promover uma intensa sequência de denúncias infundadas a órgãos públicos, protestos na porta do empreendimento e publicações nas redes sociais e na imprensa”.
De acordo com os proprietários, o estopim para destituição foi a falta de transparência a respeito da prestação de contas da empresa, quando foi proposto o aumento do valor do condomínio pela WAM. Além disso, segundo o Conselho Consultivo e Fiscal, foram identificados 847 títulos protestados contra a empresa, somando mais de R$ 15 milhões em dívidas, o que culminou em um “ponto sem retorno para a destituição da empresa”.
A WAM afirma que teve “historicamente” todas as contas aprovadas em assembleia. “O orçamento (que não é prestação de contas) que não foi aprovado devido à campanha de boicote do conselho fiscal (cujo presidente é um dos líderes do pool paralelo — comprovado com evidências cabais) e da associação por 1 voto”, acrescentou a empresa.
Confusão recente
Um dos últimos episódios das brigas entre as partes, ocorreu no dia 19 de novembro, em que proprietários relataram que a empresa administradora teria impedido a entrada de hóspedes e convidados previamente agendados com hospedagem no local, o que gerou um ambiente de caos e precisou até mesmo do acionamento da Polícia Militar de Goiás (PMGO) para apaziguar a situação.
A WAM, porém, rebate os argumentos dos proprietários. “O que existe são decisões judiciais determinando que diversas unidades não podem ser usadas para locações feitas fora do sistema oficial, os chamados “pools paralelos” ou “pool pirata”, afirmou a empresa.
Segundo a administradora, há casos de clientes clandestinos que supostamente foram induzidos a assinar procurações afirmando que não pagaram a estadia, mesmo tendo pago diretamente com o responsável do imóvel. O intuito, segundo a WAM, seria configurar o hóspede, que pagou a estadia, como convidado do proprietário para “enganar a recepção do hotel”.
De acordo com uma proprietária, é comum proprietários emprestarem o apartamento a convidados, como familiares, durante esses recessos. Contudo, quando se aproximava da véspera do feriado, eram surpreendidos com a informação de que a estadia não seria permitida.