Em decisão proferida em primeira instância, o juiz Leandro Borges de Figueiredo, da 8ª Vara Cível de Brasília do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) condenou a Agência Pública a indenizar o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) por uma reportagem embasada em apuração rigorosa e norteada exclusivamente pelo interesse público, que trazia revelações feitas por sua ex-esposa, Jullyene Lins.
Trata-se de um grave ataque à liberdade de expressão e de imprensa no Brasil. Na sentença, publicada em 23 de setembro de 2025, o juiz qualifica o “exercício da liberdade” da Agência Pública de informar, prerrogativa do jornalismo independente, como “desproporcional e indevido”, o que pode representar um perigoso precedente para o jornalismo e para a própria democracia.
Tanto a Agência Pública como a ex-esposa de Arthur Lira foram condenadas ao pagamento de 30 mil reais de indenização ao ex-presidente da Câmara dos Deputados. O juiz considerou que a reportagem, ao “reavivar” um fato antigo sobre o qual Lira já havia sido inocentado, mesmo que com uma nova acusação, teria desrespeitado os direitos de personalidade do deputado.
A reportagem publicada pela Pública em junho de 2023, fruto de apuração minuciosa baseada em documentos judiciais e dezenas de entrevistas, trazia um relato inédito de Jullyene Lins, apresentando novos elementos em relação à conduta do deputado Arthur Lira, relacionados à violência doméstica. Lira já havia sido absolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2016 da acusação de lesão corporal, como registrava a reportagem, mas a nova denúncia apresentada não havia sido analisada pela corte. O deputado também foi procurado pela Agência Pública para dar sua versão sobre os fatos antes da publicação da matéria.
Em julho de 2023, o ex-presidente da Câmara entrou com uma ação que obrigou a retirada do conteúdo de nosso site e pediu uma indenização de 100 mil reais. Por duas vezes, por dois magistrados, decisões proferidas no caso em primeira instância, negaram a censura e corroboraram os argumentos da Pública, afirmando que a matéria não tinha ânimo ofensivo e permitia ao leitor “chegar à sua própria conclusão”, mas o deputado recorreu e a reportagem continuou fora do ar. A Pública também está proibida de divulgar novas reportagens sobre o caso.
Consideramos a censura à reportagem e a condenação da Pública na recente sentença da Justiça Federal do DF um duro golpe na liberdade de imprensa e de expressão. Contra a decisão, a Pública já apresentou recurso de apelação, que será julgado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.
Em 15 anos de história, a Agência Pública vem praticando um jornalismo comprometido com o interesse público, feito com muita seriedade, tanto do ponto de vista ético como técnico, o que foi reconhecido por 90 prêmios nacionais e internacionais. Nossa independência e coragem em defesa dos direitos humanos, sobretudo dos segmentos minorizados, como as mulheres, seguirá norteando nossos passos em direção a um país mais democrático, que tem a liberdade de imprensa como um de seus pilares.
Agradecemos a solidariedade da Abraji – Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo – que publicou nota de repúdio à condenação da Agência Pública pelo caso Lira nesta quinta-feira (26/11) e a todas as organizações de jornalismo e de direitos humanos que nos apoiam no decorrer desse processo em defesa da liberdade de informar.
