O calendário global se alinha para a realização da COP30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, prometendo ser o maior fórum de discussão sobre o futuro do planeta. Contudo, nos bastidores do evento, ergue-se uma densa cortina de fumaça: o palco climático transformou-se em uma plataforma de “greenwashing de luxo”, onde as corporações historicamente mais poluidoras buscam reposicionar sua imagem.
E, neste teatro de contradições, um nome ressoa com particular estridência no cenário nacional: a Braskem.
A petroquímica, que patrocina e participa ativamente de painéis sobre sustentabilidade, é a mesma responsável pelo maior crime socioambiental urbano do país. Sua mineração irresponsável de sal-gema levou à destruição literal de cerca de 20% dos bairros de Maceió, um desastre cujas consequências urbanas e sociais são incalculáveis.
O passivo da empresa é estimado em mais de R$ 20 bilhões. No entanto, a Braskem segue sem a devida responsabilização criminal e civil plena, enquanto milhares de credores alagoanos enfrentam o calote e a indefinição. A situação é marcada por um silêncio institucional que beira a cumplicidade, garantindo à empresa uma impunidade até aqui inabalável.
O Custo da Hipocrisia Climática
A sustentação financeira da COP30 revela a dimensão da hipocrisia. O evento é bancado por um tripé de gigantes dos setores petroquímico, energético e extrativista, os principais agentes da degradação ambiental em escala industrial.
A Conferência, assim, corre o risco de se consolidar como um megaevento de marketing corporativo, gerando publicidade positiva e limpando a imagem de indústrias altamente poluentes. Para críticos da justiça climática, é um desserviço que visa apenas garantir a manutenção do lucro e a inércia na agenda de descarbonização real, traindo as verdadeiras causas ambientais.
Maceió: O Espelho da Omissão Institucional
Apesar da pompa global, a tragédia de Maceió, que caminha para completar oito anos, continua ignorada e negociada em sigilo pelas autoridades. A população atingida segue sem uma resposta concreta, sem responsabilização à altura do dano e sem uma reparação que restaure a dignidade humana.
Diante do cenário, o Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB) divulgou uma nota contundente neste sábado (1º), expondo o que classifica como uma omissão institucional generalizada. A lista de cobrados pelo MUVB é extensa, abrangendo o:
- Poder Executivo Local e Federal: Governador Paulo Dantas, Prefeito JHC e o Presidente da República.
- Poder Legislativo: Senadores e deputados federais e estaduais.
- Poder Judiciário e Controladoria: MPF-AL, MPE/AL, TCE, TCU, CGU, CNJ e Polícia Federal.
- Órgãos Técnicos e Estatais: Agência Nacional de Mineração, Defesa Civil, e diversas secretarias e universidades.
O MUVB destaca apenas uma exceção honrosa: a Defensoria Pública Estadual (DPE), por meio do Dr. Ricardo Melro, reconhecida como a única entidade a lutar ativamente pela solução do problema.
Para as vítimas, o silêncio diante de um alerta científico e social dessa magnitude é a materialização do Racismo Ambiental, que marginaliza populações pobres e periféricas, negando-lhes direitos básicos.
A Venda na Escuridão e a Saída da Braskem
Enquanto a reparação para mais de 120 mil pessoas patina, a venda da Braskem avança em ritmo acelerado. As negociações envolvendo Petrobrás, Novonor e os bancos seguem como se o desastre alagoano fosse um “detalhe irrelevante”.
A consultoria IG4, que representa os bancos na transação, foi procurada por representantes das vítimas para um diálogo sobre uma proposta de reparação construída localmente. A resposta foi o silêncio absoluto, interpretado como desprezo institucional.
A Braskem está deixando Maceió. A saída, contudo, não pode se dar sob o escudo da impunidade, blindada por interesses políticos, jurídicos e financeiros. A sociedade cobra: até quando a justiça será negada aos alagoanos em nome de um acordo de bastidores?
