A resistência antimicrobiana, apontada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma das maiores ameaças à saúde global, foi o tema da primeira edição do Educa Talks, promovido pelo Metrópoles em parceria com o Centro Universitário Euroamericano (Unieuro).
O encontro reuniu o infectologista David Uip, referência nacional no enfrentamento de epidemias e ex-secretário de Saúde de São Paulo, para discutir o problema que já vem sendo chamado de “pandemia silenciosa”.
Segundo o médico, trata-se de um fenômeno no qual as bactérias deixam de responder aos medicamentos disponíveis, tornando infecções comuns cada vez mais difíceis de tratar.
“Muitos pacientes são diagnosticados e têm à disposição diferentes remédios, mas grande parte deles já não funciona. O pior é que, diante da falta de opções, voltamos a usar antibióticos criados nos anos 1940, com resultados limitados”, afirma Uip.
Problema global e falta de investimento
De acordo com a OMS, em 2019 foram registradas 7,7 milhões de mortes causadas por infecções bacterianas em todo o mundo. Dessas, 4,95 milhões estavam associadas à resistência a antibióticos e 1,27 milhão foram diretamente atribuídas a microrganismos resistentes.
Para o infectologista, o futuro é ainda mais preocupante. “Em 2050, as mortes por bactérias multirresistentes podem ultrapassar câncer e doenças cardiovasculares. Se imaginarmos uma pessoa morrendo a cada três segundos por infecção resistente, fica claro que não estamos falando de um problema distante”, alerta o especialista.
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Apesar da gravidade, Uip destacou que há pouco investimento em novas classes de antibióticos. Atualmente, apenas 43 estão em desenvolvimento no mundo, todos derivados de gerações anteriores. “Não há nada realmente novo capaz de enfrentar a multirresistência. Se não houver incentivo público e privado para a pesquisa, continuaremos sem armas eficazes”, disse.
Desafios no Brasil e responsabilidade coletiva
O infectologista também chamou atenção para os riscos do uso inadequado de antibióticos, tanto na medicina quanto na agropecuária, além da automedicação. Segundo ele, metade das prescrições hospitalares é feita de forma inadequada, seja na dose, na indicação ou no tempo de uso.
“A resistência antimicrobiana é um problema de todos, do indivíduo que guarda a sobra de uma caixa de remédio até o médico que prescreve sem critério. Se não houver consciência coletiva, isso vai piorar”, ressaltou.
Na visão de Uip, a resposta precisa incluir educação, protocolos rígidos, diagnóstico preciso e investimento em saneamento básico, além de parcerias entre poder público e indústria farmacêutica. “Temos que ter coragem de investir no que não aparece, como esgoto e água tratada. Isso salva vidas tanto quanto um remédio novo”, afirmou.
Apesar dos desafios, ele se disse otimista com o avanço da ciência e reforça que a resistência antimicrobiana deve ser vista como prioridade global. “O antibiótico bem usado, a água tratada e a vacina continuam sendo as maiores ferramentas que temos para proteger a vida”, conclui.
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