No último sábado (26/8), Francisco Palhares, de 72 anos, entrou no centro cirúrgico do Hospital Anchieta, em Taguatinga, para receber um rim depois de quase dois anos na fila do transplante. A doadora foi sua filha, Cristiana Ferraz Palhares, de 43 anos.
“No começo, não avisei que queria doar o meu rim. Marquei com a médica para conhecer como era o procedimento antes de contar, eu queria ajudar ele”, afirma a educadora, que ainda está se recuperando do procedimento.
Cristiana conta que tem três filhos e passou por um processo “muito respeitoso, de carinho e aceitação” até decidir, por fim, doar o rim. Ela lembra que foi preciso uma conscientização da família e do pai para que todos percebessem que a doação era um gesto seguro de amor.
“Meu pai estava muito preocupado, não queria trazer prejuízos para a minha saúde, mas estou muito bem. Eu passaria por todo o medo da cirurgia só pela alegria de vê-lo caminhando, recuperado”, conta a educadora.
Ela aponta que apesar da cirurgia ter risco, como todo procedimento médico, é tão perigosa quanto atravessar uma rua. “Então, por que não fazer isso por ele agora, enquanto está em condições de saúde? Tem gente que nasce com um só rim, e eu já sou muito cuidadosa com a saúde. Posso viver o resto da vida assim”, afirma.
A cirurgia foi tranquila e bem-sucedida, e Francisco recebeu alta nessa quarta (30/8).
Cristiana Palhares e o irmão
Cristiana e o irmão enquanto estavam no hospital Arquivo Pessoal
Francisco Palhares e Helen Siqueira
Francisco, posando com a médica Helen, no dia que recebeu alta do hospital Divulgação/Hospital Anchieta
Filha doa rim para o pai de 72 anos
Filha doa rim para o pai de 72 anos. “Foi retribuição”, diz Divulgação/Hospital Anchieta
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Qual era a doença de Francisco?
Francisco tinha doença renal policística, que foi diagnosticada quando ele tinha 40 anos. A condição genética afeta uma em cada mil pessoas no mundo e é progressiva, formando cistos que se acoplam às paredes do rim, diminuindo sua capacidade de filtrar o sangue.
Desde que soube da doença, o aposentado buscou se cuidar para evitar complicações — porém, em 2020, ele sofreu um acidente de bicicleta e acabou precisando dar início ao tratamento de hemodiálise. Pouco depois, entrou na fila do transplante.
“O seu Francisco teve uma falência renal avançada. Apesar de a doença ser uma condição genética, a Cristiana, ao contrário dos irmãos, não foi afetada e quis doar para ajudar o pai. O transplante era a melhor alternativa para ele e foi lindo poder realizá-lo”, explica a nefrologista Helen Siqueira, chefe da equipe de transplante do Hospital Anchieta, em Brasília.
Cristiana conta que o pai fazia hemodiálise de segunda a sexta, e o processo, apesar de possibilitar que o paciente viva mesmo com doença renal crônica, é desgastante e cansativo. “Como família, demos um prazo para nós mesmos. Como não apareceu um doador, testamos para descobrir quem era compatível”, lembra.
O transplante de rim é o que tem a maior fila no Brasil. Das 66,2 mil pessoas esperando um órgão no país, mais da metade, 37 mil, aguardam um rim.
Nos dois anos que ficou esperando, chegaram a aparecer rins compatíveis com Francisco, mas a melhor posição que ele conseguiu foi ser o segundo candidato a uma doação.
O transplante de rim entre doadores vivos
Diante da espera, Cristiana decidiu que faria a doação do rim ao pai. O processo envolve uma série de complicações, mesmo se tratando de um familiar direto. É preciso avaliar a compatibilidade, fazer uma série de consultas para saber se o doador está saudável e consciente dos riscos, além de acariações na Justiça para comprovar que não houve transações econômicas ou coação para o recebimento do órgão.
“É um processo transparente e amplo para provar que está sendo um ato de amor. É um grande mito a ideia do contrabando e venda de órgãos. Acompanhando de perto, a gente percebe como é tudo feito para que todas as pessoas envolvidas sejam respeitadas e tenham sua saúde considerada”, aponta Cristiana.
A doação de órgãos é essencial para diminuir a fila de transplantes. No ritmo atual, seria preciso que ninguém fosse adicionado à fila por sete anos para zerar a lista de espera por um rim no Brasil.
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