Uma lojinha localizada no Aeroporto de Brasília, cuja estrutura se assemelha a uma oca, chama atenção de quem circula pelo local. O que muitos não sabem é que o quiosque, que comercializa artigos indígenas, tem como sócios membros da Confederação Nacional dos Agricultores e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer) – uma das ONGs investigadas no caso que ficou conhecido como a farra do INSS.
O primeiro sócio, como o Metrópoles já havia revelado, é Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Conafer e um dos presos pela CPI que apura os responsáveis pelo desvio do dinheiro dos aposentados. A segunda sócia da empresa é Tehiana Gomes de Freitas Pataxo – a mais nova chefe da Secretaria Nacional de Povos, Comunidades Tradicionais e Política Social (Sepocs), da Conafer.
A mulher, inclusive, assumiu o comando da Sepocs no início deste ano, seis meses após ser condenada a 13 anos de prisão por atropelar e matar uma criança de 4 anos, no Município de Pau Brasil, na Bahia. O caso aconteceu em 2021. À época, de acordo com a polícia, ela que não tinha habilitação, mas dirigia a caminhonete Hilux do namorado.

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Loja de artigos indígenas no aeroporto pertence a pecuarista envolvido em esquema na fraude do INSS
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Carlos Lopes é presidente de confederação que teria recebido R$ 688 milhões por meio de descontos indevidos de aposentados
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Conafer lida com aposentadorias de indígenas e de trabalhadores rurais
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A Conafer é investigada no esquema bilionário que teria tirado dinheiro de aposentados sem que eles soubessem dos repasses. As apurações da Controladoria-Geral da União (CGU) estimam que a Conafer tenha arrecadado cerca de R$ 688 milhões das remunerações de camponeses e indígenas desde 2019.
Em 29 de setembro deste ano, o nome de Tehiana foi citado na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do INSS – a CPMI do INSS. Na ocasião, o relator Alfredo Gaspar (União-AL) indagou Carlos Roberto a respeito de grandes movimentações que entravam e saiam da conta dele.
Entre o montante apontado, o deputado perguntou ao presidente da Conafer se ele teria transferido R$ 214 mil à Tehiana. Carlos confirmou o repasse, disse que a mulher era secretária de Ação Social da ONG, mas não explicou o motivo do pagamento. Tehiana não é investigada pela CPMI.
Veja a ata da reunião aqui

Atropelamento
Em 25 de julho de 2024, o Tribunal do Júri de Camacã, no sul da Bahia, condenou Tehiana Gomes de Freitas Pataxó a 13 anos de prisão pela morte de uma criança de quatro anos, atropelada em 2021, no município de Pau Brasil.
Segundo a denúncia do Ministério Público da Bahia (MPBA), Tehiana conduzia o veículo de forma irregular, sem ter habilitação e sem experiência com carros automáticos. Conforme o MPBA, a mulher afirmou que tentou desviar de uma motocicleta e, ao perder o controle do carro, jogou o veículo em direção a uma residência para tentar frear.
O automóvel atingiu o menino, que ficou preso entre o carro e a parede da casa. A criança morreu no local, vítima de traumatismo cranioencefálico. Conforme o processo, após o atropelamento, Tehiana e o namorado fugiram do local sem prestar socorro.
Na sentença, o juiz Felipe Remonato determinou a prisão preventiva de Tehiana, destacando a gravidade do crime e as circunstâncias do ocorrido. Apesar disso, a mulher recorreu e conseguiu na Justiça o direito de responder em liberdade.
O namorado de Tehiana, Renato dos Santos Rocha, proprietário do veículo e presente no momento do acidente, também foi condenado. Ele recebeu pena de dois anos e oito meses de prisão por homicídio culposo, além da suspensão do direito de dirigir pelo mesmo período. Renato cumprirá a pena em regime aberto.
Programa previdenciário
A Conafer divulga, no site da confederação, o Programa +Previdência Brasil, que, segundo a página, visa dar publicidade a informações sobre a educação previdenciária e o INSS Digital. As iniciativas incluem cursos sobre benefícios, de modo a auxiliar os interessados a reivindicarem os próprios direitos.
O site também detalha que não há custo nesse processo. “As associadas não receberão remuneração advinda do INSS nem dos usuários pela execução do serviço, não sendo impedidas de cobrar a mensalidade associativa do beneficiário do serviço”, diz o portal.
A investigação da CGU demonstrou, porém, que a situação não era como a Conafer fazia parecer. Os auditores ouviram 56 pessoas, em 16 unidades da Federação, que tiveram descontos feitos pela confederação. Nenhuma das vítimas havia autorizado o repasse.
A controladoria acrescentou que 621.094 aposentados tiveram desconto nos pagamentos ligados à Conafer só no primeiro trimestre de 2024.
O outro lado
O Metrópoles tentou contatar as pessoas mencionadas no texto por meio de advogados e pela própria Conafer, mas não obteve retorno até a última atualização. O espaço segue aberto para futuras manifestações.