O fígado é a maior glândula do corpo humano e desempenha funções essenciais de desintoxicação para manter o organismo em equilíbrio. Por isso, durante muito tempo o álcool foi apontado como inimigo número 1 do órgão, ao lado de inflamações virais que também são especialmente danosas, como as hepatites.
No entanto, nos últimos anos a maior ameaça é uma doença que era considerada um “mal menor”: a doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica, ou MASLD, conhecida popularmente como gordura no fígado.
A doença é causada por acúmulos de placas de gordura no órgão que inflamam e prejudicam o funcionamento do fígado quando ultrapassam 5% do seu volume.
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Associada ao sobrepeso e à alimentação com muito açúcar e gordura e uma rotina de pouca atividade física, a doença tem crescido globalmente como causadora de complicações graves como o câncer de fígado. Ela costuma ser acompanhada por outras condições metabólicas como a resistência à insulina, diabetes tipo 2 e o colesterol alto.
“Antigamente, acreditava-se que o câncer de fígado ocorria principalmente em pacientes com hepatite viral ou doença hepática relacionada ao álcool. No entanto, hoje, as crescentes taxas de obesidade são um fator de risco crescente para a doença, principalmente devido ao aumento de casos de excesso de gordura ao redor do fígado”, afirma o hepatologista Jean Tafarel, do Hospital Universitário Cajuru.
Os riscos da gordura no fígado
A MASLD já atinge cerca de 30% da população mundial e, segundo estimativas médicas, deve se tornar a principal causa de transplante de fígado até 2030. Isso acontece porque cerca de 20% das pessoas com MASLD acaba desencadeando inflamações crônicas no fígado que obrigam o órgão a se cicatrizar a ponto de desenvolver fibroses que comprometem seu funcionamento.
Embora o agravamento não seja sempre presente, como a doença é muito prevalente na população mundial, a associação entre a gordura no fígado e as doenças graves têm mudado a forma como a medicina avalia esse risco.
“O grande problema da MASLD é que ela evolui de forma silenciosa. O fígado sofre em silêncio e, muitas vezes, o diagnóstico só acontece quando já há inflamação ou fibrose”, diz Tafarel.
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A esteatose hepática é popularmente conhecida como gordura no fígado
Mohammed Haneefa Nizamudeen/Getty Images
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A condição de gordura no fígado acomete 30% da população mundial
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Alterações na função hepática podem provocar distúrbios do sono, como insônia, sonolência diurna e ciclos de descanso irregulares
Science Photo Library – SCIEPRO/Getty Images
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No início, as manifestações costumam ser inespecíficas, como cansaço, fraqueza, perda de apetite, náuseas, sensação de inchaço abdominal ou desconforto do lado direito do abdome
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Consequências graves para a sáude
Além da alimentação baseada em ultraprocessados, o sedentarismo e o estresse também influenciam a formação do depósito gorduroso. O material desencadeia inflamação, destrói células e cria cicatrizes. Nos estágios mais graves, podem surgir cirrose, câncer e falência hepática.
Além disso, pessoas com MASLD enfrentam risco maior de doenças cardiovasculares. Infartos, insuficiência cardíaca e acidentes vasculares cerebrais (AVCs) acontecem até duas vezes mais em pacientes com alterações no fígado.
Por que este agora é o inimigo nº 1?
O avanço da doença ocorreu após dois movimentos positivos. O primeiro foi o controle das hepatites virais, com vacinação contra o tipo B e novos tratamentos para o tipo C que reduziram mortes e necessidade de transplantes.
O segundo fator foi a queda no uso abusivo de álcool. O relatório mais recente do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA) mostrou que em 2023, as internações totalmente atribuíveis ao álcool (27 internações/100 mil habitantes) foram cerca de metade das observadas em 2010 (57 internações/100 mil habitantes).
“Durante muito tempo se acreditou que a esteatose não traria consequências sérias, mas hoje sabemos que pode evoluir para cirrose e até para câncer de fígado. O cuidado preventivo é essencial. O principal tratamento continua sendo o controle das causas: obesidade, diabetes e sedentarismo. Manter a pressão arterial, o açúcar no sangue e o colesterol sob controle, aliado à prática regular de atividade física é essencial para evitar a progressão da doença”, conclui o hepatologista.
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