O vírus oropouche, transmitido pela picada do mosquito Culicoides paraensis, conhecido como mosquito-pólvora, pode contaminar o feto durante a gravidez. É o que revela um caso confirmado no Ceará e descrito em um artigo publicado no último dia 30 de outubro no periódico The New England Journal of Medicine.
A gestante apresentou sintomas como febre, calafrios, dor muscular e forte dor de cabeça no fim de julho, com 30 semanas de gestação. Testes mostraram infecção pelo oropouche e deram resultados negativos para outras doenças, como dengue, zika e chikungunya. Os exames feitos no pré-natal não apontaram qualquer anormalidade com o bebê antes da infecção. No dia 5 de agosto, porém, foi diagnosticada a morte fetal.
Após uma análise de tecidos do feto, o vírus foi detectado em várias amostras, além do cordão umbilical e da placenta. O sequenciamento genético confirmou a compatibilidade com as linhagens circulantes durante o surto na região. Segundo os autores, o achado enfatiza o risco da infecção na gravidez e a necessidade de considerar esse risco diante de sintomas suspeitos em gestantes.
Também em outubro, um artigo publicado no The Lancet sinalizou a possibilidade da transmissão vertical, analisando casos potenciais e desfechos desfavoráveis, incluindo abortos e registros de microcefalia nos estados de Pernambuco, Acre e Pará.
Alguns deles continuam em investigação. Para os cientistas, essa via de transmissão aumenta a complexidade de novas formas de infecção e pode contribuir para o desenvolvimento de novos padrões da epidemia.
A oropouche é uma doença causada pelo arbovírus OROV, da mesma família dos agentes causadores de dengue, zika e chikungunya. Desde que foi identificado pela primeira vez, na década de 1960, esse agente infeccioso vem causando surtos principalmente na região amazônica. Em 2023, com a ampliação dos diagnósticos em todo o país, foi detectado em outras partes do país, inclusive no Sul.
“Como não se fazia a investigação fora da região amazônica, é uma doença muito subnotificada. Muitos casos que pareciam dengue, mas com resultados negativos nos testes, podiam ser oropouche”, explica a infectologista Emy Akiyama Gouveia, do Hospital Israelita Albert Einstein. “Como não tínhamos conhecimento da amplitude da doença no país, provavelmente tivemos mais casos [de transmissão vertical] que não foram detectados. E é algo que vamos ter que começar a estudar e entender.”
Após picar uma pessoa ou animal infectado, o mosquito-pólvora leva o vírus a outras vítimas. O diagnóstico é clínico e laboratorial. Na maioria das vezes, provoca sintomas leves, como febre, dor de cabeça e dor muscular, mas também pode causar diarreia, dor abdominal e até hemorragias. Em casos raros, há graves comprometimentos neurológicos.
Não há tratamento específico, nem vacina. Diante dos sintomas suspeitos, recomenda-se procurar atendimento médico.
A prevenção inclui evitar a exposição às picadas do mosquito, com uso de roupas compridas e repelente. Também se indica o uso de telas de malha fina nas portas e janelas, além de cuidar da limpeza de terrenos, recolhendo folhas e frutos do solo, pois o mosquito se reproduz em matéria orgânica em decomposição.
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