*O artigo foi escrito pelo professor associado de Medicina Metabólica Martin Whyte, da Universidade do Surrey, no Reino Unido, e publicado na plataforma The Conversation Brasil.
A chegada dos medicamentos análogos ao GLP-1 (como o Wegovy) marcou uma grande mudança no mercado de remédios para perda de peso. Esses fármacos demonstraram levar a uma perda de peso significativa nos usuários – até 15% ou mais do peso corporal em estudos clínicos. Por esse motivo, a demanda por medicamentos para perda de peso disparou em todo o mundo.
A maioria dos medicamentos análogos ao GLP-1 no mercado é tomada via injeção semanal sob a pele. Porém, muitas empresas estão trabalhando agora para adaptar esses medicamentos a uma forma que permita serem tomados por via oral, como uma pílula.
Mas será que os comprimidos para perda de peso serão tão eficazes quanto os medicamentos injetáveis GLP-1 já existentes no mercado?
Como funcionam os medicamentos injetáveis para perda de peso?
Quando comemos, o sistema gastrointestinal produz uma variedade de hormônios em resposta, que continuam a sinalizar a saciedade para o cérebro. Coletivamente, esses hormônios são chamados de “incretinas”. O peptídeo-1 semelhante ao glucagon (GLP-1), o polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP) e o polipeptídeo amiloide das ilhotas (amilina) são todos incretinas.
As incretinas sinalizam o hipotálamo (uma estrutura no cérebro que liga os sistemas endócrino e nervoso) e outras regiões cerebrais para informar ao resto do corpo que estamos saciados.
O medicamento semaglutida (vendido sob os nomes comerciais de Wegovy e Ozempic) imita a incretina GLP-1, que ocorre naturalmente. Mas, diferentemente do GLP-1 produzido pelo corpo (que é rapidamente decomposto por enzimas após ser liberado), a semaglutida foi farmacologicamente modificada para que o hormônio dure mais tempo no corpo, fazendo com que a pessoa se sinta saciada por mais tempo após as refeições.
Outros medicamentos para perda de peso podem atuar em mais de um receptor de incretina. A tirzepatida (vendida sob o nome comercial de Mounjaro) é a primeira incretina “dupla” disponível. Em outras palavras, ela tem propriedades de duas moléculas de incretina, atuando nos receptores de GLP-1 e GIP. Estudos clínicos mostraram que a tirzepatida é ainda mais eficaz do que a semaglutida, levando a uma perda impressionante de até 20% do peso corporal em participantes com sobrepeso ou obesos que tomaram o medicamento por 72 semanas.
Como uma pílula para perda de peso funcionaria?
A Novo Nordisk, fabricante do Wegovy, anunciou recentemente os resultados do estudo de fase 1 de uma nova pílula oral para perda de peso que está desenvolvendo, chamada amicretina.
Na Associação Europeia para o Estudo do Diabetes em setembro de 2024, os pesquisadores relataram que, nos primeiros ensaios, a amicretina levou a uma perda de 10,4% de perda de peso corporal em pessoas com sobrepeso ou obesas quando tomada em sua dose mais baixa por 12 semanas. Quando tomada em uma dose mais alta, levou a uma perda de mais de 13% do peso corporal no mesmo período. Isso foi comparado aos participantes que receberam um placebo, que perderam apenas 1% do peso corporal. A quantidade de peso perdida foi mais rápida do que quando comparada às injeções de semaglutida.
A amicretina funciona tendo como alvo dois receptores do hormônio incretina: GLP-1 e amilina.
A amilina é secretada ao mesmo tempo que a insulina pelas células do pâncreas. O hormônio desempenha um papel fundamental na regulação do açúcar no sangue (glicose), controlando a rapidez com que os alimentos são digeridos no estômago e controlando quando o hormônio glucagon é liberado. É importante ressaltar que os receptores de amilina são encontrados em regiões específicas do cérebro que regulam o apetite. Dessa forma, ela pode desencadear um sinal de saciedade após as refeições.
A perda de peso resultante dos tratamentos com GLP-1 e receptores de amilina funciona por meio de vias cerebrais separadas e compartilhadas. Por esse motivo, espera-se que a combinação das duas terapias tenha um efeito maior na promoção da perda de peso. Com base nos resultados iniciais desse estudo com amicretina, parece que isso é verdade.
Como a amicretina foi desenvolvida para ser tomada em forma de pílula, ela pode oferecer uma opção mais conveniente para o controle da obesidade. Além disso, a perda de peso não havia se estabilizado no período de 12 semanas, portanto, as pessoas podem perder mais peso do que o demonstrado até agora. E os efeitos colaterais parecem semelhantes aos de outros tratamentos à base de incretina, incluindo náusea, vômito, diarreia ou constipação.
Agora estão sendo realizados testes maiores para entender melhor a segurança e a eficácia do medicamento.
Os avanços no campo dos medicamentos para perda de peso estão evoluindo rapidamente. Outros medicamentos de incretina com duplo agonista e até mesmo triplo agonista estão em desenvolvimento. Os testes realizados até o momento mostram que eles levam a uma perda significativa de peso corporal. Várias empresas também estão trabalhando no desenvolvimento de pílulas para perda de peso que têm como alvo os receptores de incretina – com resultados de testes para alguns deles previstos para o final deste ano.
A amicretina já avançou para a próxima fase dos testes clínicos. Se for comprovado que é tão seguro e eficaz quanto foi na primeira fase de testes, poderá ser uma boa notícia para os pacientes com obesidade. Ter mais opções disponíveis no mercado também seria uma boa notícia, pois poderia ajudar a gerenciar a demanda global por medicamentos para perda de peso e aliviar a resultante escassez desses produtos.