O Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV) da Polícia Civil está investigando um caso chocante de estrupo. Bruna Ariella Alvares de Hollanda Melo, advogada, denunciou o estupro cometido por um membro da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Sergipe (OAB/SE), contra ela mesma. O crime teria ocorrido em 27 de janeiro, após um evento na capital, Aracaju.
A vítima relatou à polícia que as agressões foram tão brutais que resultaram em dilacerações no períneo, lesões na vulva e a contração de herpes. A advogada só teria percebido a gravidade do ocorrido após uma consulta ginecológica alguns dias depois, onde foram documentadas as lesões. Encorajada pela médica, ela decidiu buscar justiça e denunciar o caso às autoridades competentes.
No entanto, a jornada em busca de apoio e justiça se revelou uma experiência angustiante para a vítima. Em uma carta de renúncia pública, Bruna, expôs a sua decepção e indignação com a postura da OAB/SE diante do ocorrido. Ela acusa a instituição de omissão e falta de apoio em um momento tão delicado.
Na carta, Bruna detalha seu encontro com o presidente da OAB/SE, Danniel Alves Costa, onde esperava encontrar suporte institucional após relatar o ocorrido. No entanto, ela descreve uma resposta fria e calculada por parte da presidência, que a teria orientado a tratar o caso como uma questão ético-disciplinar comum, ao invés de tomar medidas mais urgentes e eficazes.
Além disso, a advogada relata que a presidente da comissão de defesa da mulher da OAB/SE, Dra. Flávia Elaine, foi constituída como advogada de seu agressor, o que levanta questões sobre um possível conflito de interesses dentro da própria instituição. Bruna afirma ter se sentido abandonada e desamparada pela Ordem, sem receber apoio emocional ou assistência adequada.
As denúncias de Bruna também apontam para uma suposta tentativa da gestão da OAB/SE de manipular a narrativa em torno do caso, utilizando-o como ferramenta de marketing e conduzindo uma pesquisa telefônica que distorceria a realidade dos fatos. Diante de todas essas revelações, Bruna decidiu renunciar ao cargo de Conselheira Seccional da OAB/SE de forma irretratável e irrevogável.
A carta de renúncia de Bruna, expõe não apenas a tragédia pessoal que ela enfrentou, mas também as falhas e lacunas no sistema de apoio e proteção às vítimas dentro da instituição. O caso levanta questões importantes sobre a responsabilidade das organizações em lidar com casos de violência sexual e o papel fundamental que devem desempenhar na defesa dos direitos das mulheres.
Carta Renúncia
Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Sergipe, Danniel Alves Costa.
É com imensa dor, frustração e indignação que renuncio ao Cargo de Conselheira Seccional da OAB de Sergipe, para o qual fui eleita em 2022, numa chapa composta majoritariamente por jovens advogadas e advogados, imbuída no propósito de constituir uma nova gestão na nossa instituição, comprometida com mudanças substanciais que modernizasse a OAB e valorizasse a Advocacia sergipana. Esse foi o início do projeto do qual acreditei, e hoje, finalizo minha participação profundamente decepcionada e indignada com a postura desrespeitosa, falaciosa, machista e perigosamente astuta.
Diante de todos os atos, fatos e omissões, sinto-me absolutamente desamparada e humilhada pela gestão conduzida por vossa excelência. O meu sofrimento tem sido acalentado pela minha família, pelos meus amigos e amigas e por muitas advogadas e advogados que me são verdadeiramente solidários.
Desde 08 de fevereiro, dia em que conversei pessoalmente com vossa excelência, aguardei, com esperança, que a minha instituição tomasse as providências institucionais necessárias para me acolher, preservar a minha imagem e da minha família.
Sou mulher; sou advogada; sou mãe; fui violentada covardemente; sou vítima de estupro; fui dilacerada no corpo e na alma. Ao lado de minha advogada, Drª Keziah Darlem Martins de Aragão, expus a vossa excelência tudo o que ocorreu, com a genuína confiança de que encontraria apoio imediato para enfrentar essa terrível tragédia que abateu a minha vida.
Na conversa que tivemos no gabinete da presidência da OAB/SE, confesso que senti frieza, cálculo, pendor de vossa excelência. Percebi que não estava diante do Presidente da OAB, e sim do sócio e amigo do meu abusador. Vossa excelência ouviu meu relato, e depois, ao invés de acolher uma mulher, advogada e conselheira fragilizada e abalada, preferiu rebater e contradizer as minhas palavras. Ao final, friamente, orientou-me a fazer uma representação no protocolo geral da OAB, como se tratasse de um relato ético-disciplinar comum. Quando, por preceito legal, diante de relato gravíssimo, o Presidente da OAB não só pode como deve instaurar de ofício o processo ético-disciplinar e notificar o acusado em caráter de urgência. Nada disso foi feito.
Mesmo já frustrada com o resultado da audiência que tive com vossa excelência, depois de muito refletir, eu e minha advogada, resolvemos acatar a sua sugestão e, em 16 de fevereiro, protocolei oficialmente a representação contra o advogado, conselheiro seccional e sócio de vossa excelência.
Nos dias 07 e 14 de fevereiro, também conversei com a Drª Roseline Morais, advogada que tinha como forte referência de defesa da mulher. Dela recebi a mesma postura e orientação de vossa excelência: protocole uma representação na OAB. Hoje sei que o Presidente da OAB, em casos como esse, tem o dever de instaurar de ofício e de imediato o processo ético-disciplinar e de adotar o procedimento especial para o caso concreto.
No dia 20 de fevereiro, quatro dias após a representação, fui surpreendida no grupo oficial de WhatsApp do Conselho Seccional com a mensagem de vossa excelência informando que a OAB/SE teria recebido oficialmente a comunicação de um caso lamentável de violência entre membros da gestão e que já estariam sendo tomadas as providências. Entretanto, a grande preocupação demonstrada por vossa excelência era de alinhar o discurso que seria apresentado para a mídia.
Naquele momento, vossa excelência foi contundente em expressar orientação aos conselheiros para serem ativos na defesa da gestão. Inclusive, em resposta ao clamor social e para demonstrar que a OAB estava forte e unida, todos os conselheiros deveriam comparecer ao evento da “caravana das prerrogativas”.
Resignada, continuei calada e firme aguardando o acolhimento institucional, que não tive até hoje. Nem mesmo da Caixa de Assistência dos Advogados, de onde sequer recebi uma ligação de conforto ou qualquer gesto de amparo e assistência.
Outra surpresa e frustração impactantes foi em saber que a presidente da comissão de defesa da mulher da OAB/SE, Drª Flávia Elaine, tinha sido constituída como advogada do meu agressor, acusado de estupro. Que absurdo!
Dias depois, fui informada por minha advogada, de que a Drª Flávia Elaine, teria substabelecido o mandato de procuração, com reserva de igual poder, para o outro sócio do escritório de advocacia de vossa excelência, Dr. Osny Reis de Araújo Ramos. Este, inclusive, chegou até a peticionar nos autos do inquérito policial, usando, sem qualquer pudor, o timbre do escritório em que consta o sobrenome de vossa excelência, numa evidente tentativa de me intimidar e reverter os fatos.
Fiquei sem chão. Na verdade, não queria acreditar no que via: uma conspiração de poder; o uso ostensivo e ilegal da OAB para proteger e defender o meu agressor, acusado de estupro e sócio de vossa excelência.
Sempre orientada por minha advogada, Drª Keziah Aragão, mantive-me resignada e extremamente leal à minha instituição, cujo objetivo foi de preservar até o limite a boa imagem e credibilidade que a OAB conquistou ao longo da sua história.
Depois de todos esses fatos estarrecedores, após longo período em silêncio, no dia 23 de fevereiro, vossa excelência resolveu conceder entrevista coletiva e realizar uma sessão extraordinária do Conselho Seccional no mesmo dia. Também somente neste mesmo dia é que a OAB se dignou em divulgar uma nota pública sobre o fato.
Na sequência, foi divulgado um vídeo no Instagram da OAB/SE, em que a secretária adjunta, Drª Clara Arlene, afirma que a instituição teria acolhido e dado integral apoio a mim. Um vídeo produzido pelo marketing e maquiado de impiedosa falácia, pois a verdade era bem diferente.
Em nenhum momento foi realizada uma ação institucional de apoio, de preservação e de acolhimento a mim e à minha família, mesmo após o avassalador vazamento ilegal do inquérito para a mídia, com a exposição constrangedora de todas as provas, que incluíam fotos de minhas partes íntimas.
Na entrevista coletiva concedida no dia 23 de fevereiro, vossa excelência, sem sequer me consultar, falou por mim, achando-se no direito de informar que eu estava bem. Não, Presidente, eu não estou bem. Fui violentada e não recebi apoio da minha instituição presidida por vossa excelência. O que tenho recebido é a solidariedade e o amor da minha família, das minhas amigas e amigos e das mulheres realmente comprometidas com a defesa do Direito da Mulher.
Nessa entrevista coletiva, vossa excelência, talvez orientado pelo marketing, falou inverdades acintosas: que a OAB teria me acolhido e que não podia instaurar de ofício o processo ético-disciplinar. Ao final, concluiu de forma melancólica, ao atribuir a culpa às mulheres que compõem a comissão de defesa da mulher da OAB.
Mesmo assim, ainda me mantive silente. Procurei restabelecer-me emocionalmente. Mas neste final de semana, os fatos dolorosos e falaciosos voltaram a público com crueldade.
Recebi a informação de diversas amigas e amigos de que a gestão de vossa excelência teria contratado um instituto de pesquisa para abordar de forma induzida, como instrumento de marketing, usando o meu drama pessoal, para transmitir por telefone aos advogados e advogadas entrevistadas as supostas ações tomadas pela OAB no caso de estupro envolvendo dois conselheiros.
Na dita “pesquisa”, o instituto primeiro afirma, como se verdade fosse, que a OAB teria dado suporte à vítima, instaurado processo e afastado o conselheiro acusado. Na sequência, o pesquisado é orientado a escolher se considera as medidas acertadas, brandas, exageradas, insatisfatórias, desnecessária ou não sabe responder.
Mesmo não tendo recebido ligação da empresa contratada pela gestão da OAB com o dinheiro da anuidade dos advogados de Sergipe, afirmo, categoricamente, nesta carta renúncia, como mulher, advogada e vítima de violência sexual, que não recebi acolhimento nem qualquer suporte da OAB/SE.
Reafirmo, Presidente Danniel Alves Costa, agora por escrito nesta carta de renúncia, que fui estuprada no dia 27 de janeiro por um colega conselheiro da OAB/SE, seu sócio e amigo, pessoa de quem tinha inteira confiança, colega de Conselho Seccional e amigo há mais de oito anos.
Respondo agora por escrito a pergunta que vossa excelência me fez e que depois proliferou na surdina nos meios de conversas maldosas: por que você subiu ao apartamento?
A única resposta que posso dar a essa pergunta é: subi porque confiava no amigo e colega advogado. Jamais imaginei que poderia sofrer a violência que sofri. O simples fato de ter subido não descaracteriza o estupro nem levanta suspeição séria aos fatos narrados por mim.
Diante de tanta desfaçatez, que ultrapassou todos os limites; diante das
violências psicológicas que venho sofrendo; diante dos fatos indignos e reiterados aqui expostos, é que com incomensurável tristeza e pesar renuncio ao cargo de Conselheira da OAB/SE, de forma irretratável e irrevogável.
Entretanto, Presidente, com coragem e fé na Justiça, não declinarei da luta pelo meu sagrado direito de viver com dignidade e respeito.
Aracaju, 18 de março de 2024.
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Bruna Ariella Alvares de Hollanda Melo
OAB/SE nº 11.310