Bolsonaristas em CPI esgotam tempo com discursos e depoentes falam por segundos

Todos os deputados distritais da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) aprovaram a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos para, em tese, esclarecer os fatos de 12 de dezembro de 2022 e 8 de janeiro de 2023. Mas os bolsonaristas têm demonstrado pouco interesse em elucidações, usando grande parte do tempo disponível para discursos, colhendo apenas segundos de informações de depoentes em algumas sessões.

A última oitiva, realizada quinta-feira (3/8), demonstra essa avaliação da forma mais objetiva possível, com números. Abrindo os trabalhos do semestre, a CPI ouviu o major da Polícia Militar do DF Flávio Silvestre de Alencar, preso duas vezes por investigações de atos antidemocráticos. O PM, no entanto, não teve sequer um minuto de fala durante os quase 30 minutos usados, na soma, pelos dois deputados distritais do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Os membros da CPI do Partido Liberal, Thiago Manzoni e Joaquim Roriz Neto, usaram, cada um, cerca de 15 minutos para “questionar” o depoente sobre o golpe de 8 de Janeiro. Mas as três perguntas de Manzoni foram respondidas em quase 35 segundos pelo PM, que respondeu em ainda menos tempo – 16 segundos – as quatro perguntas de Joaquim Roriz Neto.

Durante o restante do tempo, os distritais bolsonaristas apenas discursaram, sendo ouvidos pelo major Flávio Silvestre, que é peça importante para alguns esclarecimentos. O militar chegou a mandar mensagens de WhatsApp para outros policiais, falando: “Na primeira manifestação, é só deixar invadir o Congresso”, além de aparecer em vídeo ordenando uma movimentação da tropa que acabou facilitando o acesso de vândalos ao Supremo Tribunal Federal (STF).


0

Fora do PL, mas também alinhado ao bolsonarismo, o deputado pastor Daniel de Castro (PP) só ouviu o depoente por pouco mais de dois minutos, mesmo destacando “a importância dessa Comissão na busca pela verdade”. Nos outros 23 minutos do tempo dele, foi o investigado que ouviu o distrital discursar.

Esquerda

No começo da CPI, Chico Vigilante (PT) e Hermeto (MDB) usaram do tempo livre que dispõem, como presidente e relator, respectivamente, para questionamentos. Cada membro titular tem 25 minutos para conseguir novas informações do depoente, enquanto os suplentes têm 15.

Os distritais de esquerda questionaram mais e ouviram mais detalhes do dia da tentativa de golpe. Gabriel Magno (PT), por exemplo, teve 15 minutos. Quase um terço do tempo – 4 minutos e 42 segundos – foi ocupado por falas do investigado. Fábio Felix (PSol), nos seus 25 minutos, chegou a fazer 42 perguntas, deixando o major falar por mais de 10 minutos.

Outras sessões

O uso da CPI pela direita como palco não é exclusividade da última sessão. Em uma das oitivas consideradas mais importantes para o trabalho de apuração da Casa, quando o general Augusto Heleno prestou depoimento, o mesmo cenário foi visto. Ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Heleno era o primeiro ex-ministro de Jair Bolsonaro a comparecer na Comissão e prestar esclarecimentos.

Mas quem deixa clara a visão mais alinhada ao bolsonarismo não se importou muito com o que o militar poderia revelar. Paula Belmonte (Cidadania), que vem usando a CPI para defender o acampamento golpista em frente ao Quartel-General do Exército, sequer perguntou algo para o general Heleno. Durante a fala dela, o ex-ministro ouviu elogios e um discurso que citou até a crise na Venezuela. “Golpe é receber um ditador. [….] Eu vi centenas de venezuelanos passando fome.”

Manzoni, dessa vez, questionou o depoente. “Vossa excelência tem 75 anos hoje, isso?”, foi a única pergunta, logo no início do seu tempo, antes de uma série de palavras de admiração ao general. “Para essa Câmara Legislativa, a presença do senhor a torna mais nobre”, disse. No fim da sessão, Augusto Heleno chegou a defender o golpe que instalou a ditadura militar no Brasil. Ao todo, 434 pessoas foram assassinadas ou desapareceram durante aquele período, além dos casos de tortura, segundo relatório final da Comissão Nacional da Verdade.

Sair da versão mobile