Se o fim da Odebrecht pode ser contado em atos, o último deles se chama Braskem. A venda da maior petroquímica da América Latina tornou-se o ponto central do desmonte do antigo império envolvido em escândalos de corrupção, e em 2025, essa operação se arrasta como uma novela de bilhões. No centro da disputa estão o investidor Nelson Tanure, os bancos credores da Novonor (novo nome da Odebrecht) e uma Petrobras fortalecida, que quer mais protagonismo na condução dos negócios.
Criada em 2002, a Braskem é estratégica para o setor industrial: líder na produção de resinas nas Américas e destaque mundial em biopolímeros. Seu controle é dividido — 50,1% das ações com direito a voto pertencem à Novonor, enquanto 47% estão nas mãos da Petrobras. O que está em jogo, portanto, não é apenas a venda de uma empresa, mas a definição de quem terá voz sobre um setor vital para o país.
A origem do impasse
A crise se arrasta desde 2019, quando a Odebrecht, arrasada pela Lava Jato e sem acesso a crédito, entrou com o maior pedido de recuperação judicial da América Latina: R$ 98,5 bilhões em dívidas. A principal esperança para pagar essa conta é a venda de sua fatia na Braskem.
Nos anos seguintes, a venda passou a ser tratada como prioridade. Em 2024, a oferta mais concreta veio da Adnoc — a estatal de petróleo dos Emirados Árabes — que propôs pagar R$ 10,5 bilhões pela fatia da Novonor. No entanto, em maio do mesmo ano, a Adnoc retirou oficialmente a proposta, reconfigurando o jogo.
Empresas brasileiras como a Unipar e a J&F chegaram a mostrar interesse, mas, em 2025, o nome que desponta como favorito é o de Nelson Tanure. Conhecido por movimentos estratégicos em empresas problemáticas, Tanure apresentou uma proposta considerada viável por atacar o principal obstáculo à venda: os bancos credores.
Bancos, Petrobras e Tanure: uma equação difícil
Cinco instituições financeiras, Bradesco, Itaú, Santander, Banco do Brasil e BNDES, detêm ações da Braskem como garantia de dívidas da Novonor. Juntas, elas têm cerca de R$ 15 bilhões a receber. No entanto, o valor atual de mercado da empresa é bem inferior, o que significa prejuízo certo para os bancos se a venda for fechada nos moldes atuais.
Além dos bancos, outro ator-chave é a Petrobras. Sob nova gestão, a estatal abandonou a postura de vender sua fatia na Braskem e passou a tratá-la como um ativo estratégico. Hoje, a companhia exige mais poder nas decisões e quer ter peso real na governança da empresa, o que impõe mais uma camada de complexidade às negociações.
A proposta de Tanure busca justamente acomodar esses interesses: além de negociar diretamente com os bancos, o investidor se compromete a garantir uma posição de comando mais significativa para a Petrobras, condição essencial para que a estatal apoie o desfecho da operação.
Apesar do potencial estratégico, quem comprar a Braskem também herdará seus problemas. Além da crise global no setor petroquímico, a empresa responde por um dos maiores desastres ambientais do país. A mineração de sal-gema em Maceió (AL), feita por décadas, causou o afundamento do solo em cinco bairros, desalojando milhares de moradores. O passivo ambiental e jurídico do caso ainda é incerto e poderá custar bilhões.
O fim de um império
A venda da Braskem é, antes de tudo, o capítulo final da antiga Odebrecht — uma empresa que já foi símbolo do poder empresarial brasileiro e, depois, da corrupção sistêmica revelada pela Operação Lava Jato. A transação deve marcar o encerramento da maior recuperação judicial da América Latina e selar o destino de um grupo que moldou, para o bem e para o mal, a história recente do país.
Se a proposta de Tanure conseguirá equilibrar os interesses de bancos e Petrobras, ainda não se sabe. Mas o desfecho dessa venda bilionária não afetará apenas o futuro da Braskem: ele será o epílogo de uma era inteira do capitalismo brasileiro.