A proteína SerpinB3, conhecida por estar presente em vários tipos de câncer, foi identificada como peça-chave no processo de cicatrização da pele. O estudo, publicado em setembro na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), revela que a molécula é ativada logo após uma lesão e ajuda as células a reconstruírem o tecido epitelial — um papel biológico até então desconhecido.
Leia também
A SerpinB3, também chamada de antígeno de carcinoma de células escamosas 1 (SCCA-1), é amplamente usada como marcador tumoral, especialmente em cânceres de fígado, pulmão e cabeça e pescoço. Mas, segundo a equipe da Universidade Estadual do Arizona, nos EUA, ela tem uma função natural no corpo: participar da resposta de reparo da pele após um ferimento.
Os cientistas analisaram tecidos humanos e modelos animais e observaram que, sempre que há uma lesão, as células da borda do ferimento aumentam rapidamente a produção da proteína.
Esse aumento foi confirmado tanto em experimentos com pele humana cultivada em laboratório quanto em feridas de camundongos. A forma equivalente da proteína nesses animais, chamada Serpinb3a, apresentou o mesmo comportamento.
Durante a investigação, os pesquisadores perceberam que a SerpinB3 faz as células da pele se tornarem mais móveis e menos aderentes, facilitando que elas “deslizem” para cobrir a área lesionada. Essa mudança temporária no comportamento celular é semelhante a um processo chamado transição epitélio-mesênquima, comum em fases iniciais de regeneração e também observado em tumores.
Nos testes, os animais tratados com Serpinb3a apresentaram fechamento mais rápido das feridas e uma melhor organização das fibras de colágeno, que formam a estrutura de sustentação da nova pele. Esses resultados sugerem que a proteína ajuda não apenas a acelerar o processo, mas também a melhorar a qualidade do tecido formado.
Os pesquisadores descrevem a SerpinB3 como um “interruptor molecular”. Em condições normais, ela é ativada para restaurar a pele e promover a regeneração. Já em alguns cânceres, o mesmo mecanismo é “sequestrado” pelas células malignas, que o utilizam para se multiplicar e invadir outros tecidos. Esse duplo papel explica por que a proteína é abundante em tumores agressivos.
Além de ajudar a entender melhor o comportamento dos cânceres, a descoberta pode abrir caminhos para novas terapias de feridas crônicas, como úlceras diabéticas ou queimaduras, nas quais o reparo da pele é lento e ineficiente. Estimular a produção natural da SerpinB3 ou aplicar versões seguras da proteína pode se tornar uma estratégia de tratamento no futuro.
Os cientistas destacam, no entanto, que é preciso cautela. Ainda não se sabe se aumentar artificialmente os níveis da proteína em humanos é seguro ou se poderia ativar processos indesejados, como proliferação celular excessiva. Mesmo assim, o estudo redefine o papel da SerpinB3: de simples marcador tumoral, ela passa a ser reconhecida como uma ferramenta natural de regeneração tecidual.
Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!