Um banco de fachada ligado à mãe do auditor fiscal preso na última terça-feira, 12, ostentava um capital social de R$ 3,4 bilhões formado por títulos sem valor e documentos questionáveis. A operação, segundo o Ministério Público de São Paulo (MPSP), fazia parte de um esquema de corrupção tributária que teria movimentado propinas bilionárias.
A empresa, inicialmente registrada em 2023 como Dac Bank, e que em agosto deste ano mudou o nome para Visão Suporte Administrativo, é apresentada como uma fintech, mas não possui autorização do Banco Central (BC) para operar como instituição financeira. Mesmo assim, anunciava serviços típicos de banco em seu site, retirado do ar na semana passada após a deflagração da Operação Ícaro, conduzida pelo Grupo de Combate ao Cartel e à Lavagem de Dinheiro (Gedec).
Entre os ativos que compunham o suposto capital da empresa estão R$ 1,4 bilhão em títulos do Banco do Estado de Santa Catarina (Besc), extinto em 2009, e R$ 2 bilhões em créditos registrados em cartório de Monte Sião, no interior de Minas Gerais. Nenhum dos valores, contudo, correspondia a dinheiro em caixa.
Suspeita de lavagem
De acordo com as investigações, a fintech recebeu R$ 54 milhões de uma consultoria tributária ligada a empresas que, em troca de benefícios fiscais, teriam pago propina ao auditor Artur Gomes da Silva Neto. A mãe dele, Kimio Mizukami, de 73 anos, aparece como sócia da companhia e é apontada pelo MPSP como laranja do esquema.
Artur, que figura como administrador nos registros da Junta Comercial, teria usado a empresa para ocultar recursos desviados. Em e-mails interceptados pela Promotoria, o fiscal aparece orientando diretores de companhias sobre como manipular documentos e processos de ressarcimento de créditos tributários.
Segundo o promotor João Ricupero, do Gaeco, Artur atuava “nas duas pontas”: como fiscal responsável por liberar créditos e como consultor de fachada para as empresas beneficiadas. “Ele conseguia créditos superiores àqueles que a empresa efetivamente apurava”, afirmou Ricupero.
Propina bilionária
O MPSP estima que o auditor tenha recebido cerca de R$ 1 bilhão em propinas desde 2021. Parte dos valores era paga em espécie, pacotes de dinheiro foram encontrados na casa dele durante a operação.
Grandes redes varejistas como Ultrafarma, Fast Shop, Oxxo e Kalunga aparecem nas investigações como beneficiárias do esquema, ainda em fase de apuração.
Fragilidade das fintechs
O caso reacende o debate sobre a fragilidade na fiscalização de fintechs que, sem autorização do Banco Central, se apresentam como bancos digitais. Na prática, essas empresas dependem de instituições parceiras licenciadas para oferecer serviços como conta digital, Pix e transferências.
O Dac Bank, que também usava o nome Dac Pay, chegou a processar uma instituição financeira por suposto descumprimento de contrato e alegava, em seus termos de uso, ter lastro em um banco de pequeno porte.
A investigação do MPSP segue em curso e deve aprofundar a análise sobre a participação das empresas varejistas e o destino dos recursos movimentados pela estrutura de fachada.