Relatos narrados em detalhes por crianças à Justiça, bem como apresentação de provas documentais – como uma “confissão informal” – determinaram a prisão do fotógrafo brasiliense Tomás Faquini, no fim de outubro. Ele foi condenado a 13 anos e 2 meses de prisão pelos crimes de estupro de vulnerável e importunação sexual cometidos contra menores de 7 a 14 anos.
Tomás foi acusado de cometer os abusos, em sua maioria, dentro da chácara onde morava, em São Sebastião, no DF – endereço para onde convidava as famílias das vítimas após conquistar a amizade e confiança delas.
No local, e sem que os adultos percebessem, o homem cometia os crimes. Os episódios envolviam toques, mordidas nas partes íntimas das crianças e beijos na boca sob o pretexto de “brincadeiras”. As vítimas também relataram que o fotógrafo colocava a mão dentro das roupas que usavam e as coagia a ficar em silêncio.
Na decisão que condenou o réu, o juiz declarou que os depoimentos das crianças foram “coerentes, harmônicos e compatíveis com a dinâmica dos fatos”, afirmando que não havia dúvida razoável sobre a materialidade e autoria dos crimes. O processo transitou em julgado e não cabe mais recurso.
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Ao Metrópoles uma jovem – que aqui será identificada pelo nome de Maria* – contou que foi vítima do fotógrafo aos 12 anos. Ela, que agora é maior de idade, narrou que o homem simulava brincadeiras para tocar em suas partes íntimas.
“Eu e minha mãe, que era amiga do Tomás, fomos visitar a chácara dele no dia. O local era sempre muito cheio de amigos que Tomás convidava, que iam à chácara e levavam os filhos. Naquela data, quando todas as crianças foram embora, me colocaram para assistir filme. Tempo depois, o Tomás chegou, começou a fazer cosquinha em mim, mesmo eu pedindo para parar, e passou a tocar meu corpo por baixo da roupa”, descreveu.
“Eu insistia para que ele parasse, mas ele dizia que era brincadeira e continuava. Em determinado momento, Tomás começou a assoprar minha barriga e desceu a cabeça para a minha parte íntima. Quando eu consegui me desvencilhar, corri chorando e me tranquei no carro”, detalhou a jovem.
Maria* também narrou que o homem fingiu fazer massagem nos pés dela para colocá-los sobre o pênis dele. “Ele acabou com a vida de muitas meninas, inclusive a minha. Não tinha um dia que eu não pensasse no que ele fez comigo. Precisei de muita terapia para conseguir falar sobre o que aconteceu e conseguir voltar a viver”, desabafou.
O caso de Maria* foi revelado em outra ação. Nela, Tomás foi condenado em primeira instância, mas absolvido na segunda. Tempo depois, um segundo processo envolvendo mais três crianças – mencionado anteriormente, levaram o réu à prisão.
“Erro Criminoso”
Após cometer o crime contra uma das crianças, o fotógrafo encaminhou uma mensagem para à responsável pela menor dizendo ter “praticado fatos infelizes e horrendos”, pedindo desculpas e dizendo que cometeu “erro criminoso”.
“[…] Afogado em arrogância e ignorância, eu rompi com meu sagrado e me perdi. Quero que saiba que pretendo reparar de alguma forma – que ainda nem sei como ao certo, já que dores como essas não têm reparação verdadeira”, declarou.
“Por isso, peço seu perdão e minhas mais sinceras desculpas por ter atravessado uma fronteira que eu realmente não tinha direito de fazer. Cometi um erro criminoso que muito me envergonha e com certeza é uma mancha que levarei comigo para o julgamento lá do outro lado”, escreveu o homem.
A prova, conforme a Justiça, passou por perícia técnica, que atestou a autenticidade das mensagens trocadas entre Tomás e a mãe da menor.
Ao Metrópoles uma outra mãe falou sobre a importância da condenação: “O trauma que um abuso sexual causa em uma criança e em suas famílias é algo incomensurável e que temos de lidar por toda a vida. A criança muitas vezes não entende o que aconteceu quando pequenas, mas na adolescência essa conta chega, e é devastador”, contou.
“É muito importante que crimes como esse sejam exemplarmente punidos no Brasil, onde crianças são abusadas todos os dias e muitas vezes dentro de suas próprias casas. A punição serve para afastar [os criminosos] da sociedade e da possibilidade de ter contato com os menores”, pontuou.
Procurada, a advogada Manuela Paes Landim, que representa as vítimas, declarou que a prisão do fotógrafo “representa a força do trabalho sério, comprometido e ético das instituições”: “Nenhum preparo técnico é suficiente para lidar com a brutalidade de uma violência que destrói a inocência e fere o sentido mais básico de humanidade”.
“Mesmo quando a Justiça cumpre seu papel, o sentimento que fica é ambíguo, pois nenhuma sentença é capaz de apagar o trauma das vítimas ou devolver a infância roubada. A prisão do agressor, porém, é um passo importante, mas a verdadeira reparação exige muito mais: consciência, acolhimento e transformação social”, destacou.
Justiça rejeitou versão do réu
Na Justiça Tomás Faquini negou a prática dos crimes e alegou ter sido vítima de uma “armação” articulada pelas mães das vítimas. Segundo ele, uma ex-namorada, inconformada com o fim do relacionamento, teria incentivado as denúncias com o objetivo de prejudicá-lo.
A Justiça, entretanto, rejeitou a versão, considerando-a incompatível com as provas documentais e testemunhais. Magistrados entenderam que os primeiros atos cometidos pelo fotógrafo ocorreram em 2017, antes mesmo de ele iniciar relacionamento com a mãe de uma das vítimas.
A sentença destacou que Faquini se aproveitou da confiança e da vulnerabilidade das vítimas, criando um ambiente de familiaridade para “saciar o desejo sexual dele”, sob pretexto de brincadeiras.
“As pessoas acham que a denúncia de abuso infantil é feito pela mãe, mas é a própria criança que narra o que aconteceu. Elas são levadas a uma sala para falar sozinhas com os psicólogos. Então, se o processo chegou onde chegou foi porque os psicólogos atestaram que as crianças não estavam mentindo”, disse uma terceira mãe ouvida pelo portal.
Para um dos juízes responsáveis pelo caso, a demora das vítimas em contar o que haviam sofrido é compatível com o comportamento de crianças e adolescentes abusados, “frequentemente marcados por medo, vergonha e sentimento de culpa”.
O Metrópoles tentou contatar a defesa de Tomás por meio do advogado dele, mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem. O espaço segue aberto para possíveis manifestações.
