Crime recorrente no Distrito Federal, os furtos e roubos relacionados a rede de energia elétrica é um problema que vai além da segurança pública. Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mostram que, no ano passado, 7.664 unidades consumidoras foram afetadas por causa dessa prática, o que deixou cada uma delas, em média, 18 horas e 30 minutos com o fornecimento interrompido.
Neste ano, somente até agosto, os números já superam os de 2024. Segundo a Aneel, foram 8.131 consumidores afetados (aumento de 6%), cada um deles ficando cerca de 22 horas sem energia elétrica — um crescimento de 19% no período com o abastecimento suspenso. De acordo com a agência, os dados são repassados mensalmente pela Neoenergia Brasília e estão relacionados a qualquer tipo de equipamento que compõe a rede elétrica.
O engenheiro eletricista e professor da Universidade Católica de Brasília (UCB) Luciano Duque ressalta que a questão dos roubos/furtos apresenta uma “complexidade considerável”.
Segundo o especialista, a frequência desses delitos pode ser atribuída, em grande parte, ao fato de que a maioria dos cabos alvos são subterrâneos e compostos por cobre, que tem grande valor de mercado. “A tecnologia empregada nessas instalações favorece o uso desse metal, o que os torna alvos preferenciais”, explica.
Duque afirma que uma solução para mitigar essa prática é a instalação de sensores nas redes subterrâneas. “Esses dispositivos monitoram a integridade dos cabos e, em caso de rompimento, disparam um alarme em um sistema centralizado de gerenciamento. A partir daí, a concessionária pode acionar uma equipe técnica e a polícia, atendendo a ocorrência o mais rápido possível”, avalia.
Prática corriqueira
Dados da Secretaria de Segurança Pública mostram que, de janeiro a agosto deste ano, foram registradas 1.617 ocorrências de furtos de cabos de transmissão de dados, telefonia e energia no DF — uma média de, aproximadamente, 202 casos por mês, na capital do país.
Falando somente do cabeamento elétrico, em todo o ano passado foram 263 registros, contra 299, somente até 23 de setembro deste ano — aumento de 14% — de acordo com a Neoenergia.
Em julho deste ano, um homem de 30 anos foi retirado de dentro de um buraco (foto em destaque) para ser preso por furtar os cabos de energia do local. O caso ocorreu na Rua 25, em Águas Claras, no dia 20 de julho.
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Nove dias depois, dois homens foram presos ao furtar cabos de energia na SHCGN 704, na Asa Norte. Os suspeitos foram encontrados e detidos nas proximidades do Centro Universitário de Brasília (Ceub).
Em agosto, dois homens foram presos, um deles pela quarta vez, furtando cabos de energia, somente neste ano. O flagrante foi feito na noite do dia 18, na Asa Norte, próximo ao Autódromo de Brasília. Os suspeitos foram flagrados com os cabos e um alicate nas mãos.
No dia seguinte, policiais civis da 3ª Delegacia de Polícia (Cruzeiro) realizaram uma operação contra ladrões de cabos de energia e transmissão de dados no DF. Segundo a investigação, os criminosos usavam uniformes de técnicos de telefonia para despistar a polícia e deram prejuízo de R$ 1 milhão.
Um homem chegou a entrar dentro de um bueiro para furtar cabos de energia
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No fim de julho, dois homens foram presos com 10 metros de cabos de energia furtados
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Em agosto, dois homens foram flagrados furtando cabos próximo ao Autódromo de Brasília
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No mesmo mês, a PCDF fez uma operação contra um grupo que furtava cabos fingindo serem técnicos de telefonia
Ação coordenada
Desde julho, está em vigor a Lei nº 15.181/2025, que tipifica e aumenta as penas aplicadas ao furto, roubo e receptação de fios, cabos ou equipamentos utilizados para fornecimento ou transmissão de energia elétrica ou de telefonia ou para transferência de dados e as aplicadas à interrupção ou perturbação de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de utilidade pública.
Contudo, para o pesquisador do Grupo Candango de Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (GCCrim/FD/UnB) Welliton Caixeta Maciel, apenas o agravamento de penas não tem sido capaz de desestimular criminosos. “Eles atuam em redes criminosas e diluem muito rapidamente o produto fruto desses crimes”, observou.
Segundo o especialista, diante deste cenário, é fundamental uma ação coordenada de inteligência entre os órgãos da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), com a colaboração da empresa de energia e da população que constatar tais crimes.
“É imprescindível a intensificação das investigações pela Polícia Civil, a fim de desmontar toda a rede de comercialização de produtos provenientes dos cabos de energia e de telefonia. Esse tipo de criminalidade existe porque tem demanda pelo produto, sendo fundamental a responsabilização dos receptadores”, opinou Caixeta.
Elaboração de estratégias
Procurada pela reportagem, a Secretaria de Segurança Pública informou, por meio de nota, que tem direcionado investimentos para a capacitação das forças de segurança, a melhoria dos equipamentos utilizados e a adoção de tecnologias avançadas para otimizar o trabalho policial e o fortalecimento dos processos de gestão.
Segundo a pasta, relatórios semanais são compartilhados com as forças de segurança, apontando as chamadas manchas criminais, em que é possível detectar dias, horários e locais de maior incidência de crimes, garantindo um policiamento efetivo.
“Destacamos a importância do registro de ocorrências pela população para subsidiar a elaboração de estudos e manchas criminais que indicam dias, horários e locais de maior incidência de cada crime, entre outras informações relevantes para o processo de investigação”, afirmou a nota.
De acordo com a SSP-DF, esses levantamentos são utilizados na elaboração de estratégias para o policiamento ostensivo da Polícia Militar (PMDF), bem como para a identificação e desarticulação de possíveis grupos especializados, por parte da Polícia Civil (PCDF).