Juíza se casa em comunidade quilombola em cerimônia com 49 casais

A maior comunidade quilombola do Brasil, os kalungas, que ocupam 262 mil hectares na Chapada dos Veadeiros (GO), ainda enfrenta um desafio que vai além da luta por território: a invisibilidade nos registros oficiais. Por décadas, milhares de moradores viveram sem certidão de nascimento, casamento ou óbito, condição que os afastava de políticas públicas, benefícios sociais e do próprio reconhecimento do Estado.

Na última quinta-feira (25/9), parte desse passivo começou a ser reparado em Cavalcante. Em um casamento comunitário realizado na Feira Municipal, 49 casais disseram “sim” e oficializaram uniões que, até então, existiam apenas de forma simbólica. Entre eles estava a juíza da comarca, Isabela Rebouças Maia, que decidiu casar no mesmo altar que os moradores locais.

O evento integra o projeto Raízes Kalungas – Justiça e Cidadania, do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), e não é apenas festivo: ele gera efeito direto nos dados civis da população. Cada certidão de casamento emitida entra nos sistemas oficiais e atualiza os registros familiares, permitindo a inclusão de cônjuges em benefícios previdenciários, regularização de herança, além de facilitar cadastros em programas sociais.

“O que me faria diferente de todos os outros casais da comarca em que moro? Cavalcante já é a minha cidade, já é a minha comunidade. Foi justamente essa facilidade, sem burocracia, que nos levou a escolher o casamento comunitário”, disse a magistrada.

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Casamento coletivo em Cavalcante (GO) reuniu 49 casais kalungas e marcou avanço na inclusão civil da comunidade quilombola

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Cada certidão emitida atualiza registros familiares e garante acesso a direitos como previdência, herança e programas sociais

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Cerimônia do projeto Raízes Kalungas aliou festa, cidadania e pertencimento, com direito a vestidos arrecadados, dia de beleza e jantar comunitário

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Juíza Isabela Rebouças Maia oficializou sua união no mesmo altar que moradores locais, reforçando o caráter simbólico e reparador do evento

Reprodução/TJGO

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Desde que o programa começou, já foram expedidos mais de 4 mil documentos, instalados sete Pontos de Inclusão Digital (PIDs) e capacitados 30 moradores para atuar como agentes locais de cidadania.

A cerimônia também teve momentos de acolhimento: vestidos foram arrecadados em campanhas solidárias, as noivas participaram de um “dia de beleza” promovido pelo Senac, e o jantar coletivo, preparado pelo Sesc Cora com insumos do TJGO, reuniu cerca de 500 pessoas.

Para o presidente do TJGO, desembargador Leandro Crispim, a iniciativa tem caráter reparador. “Mais do que um ato jurídico, o casamento comunitário é um gesto de aproximação com a comunidade e de valorização da cultura quilombola, que merece nosso mais profundo respeito e reconhecimento.”

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