No coração de São Paulo, um novo marco artístico surge para provocar reflexões sobre saúde mental e inclusão. A artista mato-grossense radicada em Alagoas, Ursa Nath, assina o mural monumental “O Navegar de Nise”, em homenagem à psiquiatra alagoana Nise da Silveira, referência na luta antimanicomial. A obra, que cobre um prédio de 20 andares e 66 metros de altura na Avenida Duque de Caxias, foi produzida em parceria com a iniciativa Parede Viva e uma equipe de quatro artistas: Iskor, Loss, Negana e Bea Corradi.
O painel retrata Nise da Silveira cercada por elementos inspirados na expressão artística dos pacientes do Museu do Inconsciente, criado por ela. A obra traz uma das frases mais marcantes da psiquiatra: “Gente curada demais é chata. Todo mundo tem um pouco de loucura.” Para Ursa, essa mensagem desafia a imposição social de uma imagem constante de sucesso e bem-estar, especialmente nas redes sociais.
A inspiração para o mural surgiu após a artista visitar uma exposição sobre Nise no Sesc Belenzinho. “Já conhecia sua trajetória, mas a exposição me conectou ainda mais com sua história. Isso me fez querer homenageá-la de forma grandiosa”, conta Ursa.
O processo de criação incluiu esboços baseados em pesquisas e fotografias da psiquiatra e de seus pacientes. Entre os elementos visuais da obra, destacam-se esculturas, mandalas e navios, referências diretas ao universo criativo dos pacientes atendidos por Nise. “Sua visão sobre utilizar a arte como forma de tratamento, em vez de lobotomia e terapias de choque, é o que mais me inspira”, ressalta a artista.
A localização do mural também carrega um forte simbolismo. Instalado em uma região que abriga muitas pessoas em situação de vulnerabilidade social, o painel busca lançar luz sobre a marginalização de pessoas com transtornos mentais e dependências químicas. “A produtora já queria um painel neste prédio há anos. Minha proposta se encaixou no momento certo, quando autorizaram o local”, explica Ursa.
Além de homenagear a psiquiatra, a obra pretende fomentar uma reflexão sobre como a sociedade trata pessoas com transtornos mentais. “Espero que esse mural leve as pessoas a se lembrarem do legado de Nise e da importância de discutirmos o porquê de tantas pessoas viverem em condições indignas nas ruas. Precisamos pensar em soluções mais humanizadas para romper esse ciclo de adoecimento”, destaca a artista.
Com suas cores vibrantes e impacto visual imponente, “O Navegar de Nise” se insere no cenário urbano como um convite à empatia e à valorização de abordagens mais humanas para a saúde mental.