O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), reviu sua própria decisão e determinou ontem que redes voltem a divulgar um vídeo e dois textos jornalísticos com denúncias da ex-mulher do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), Jullyene Lins, contra o deputado.
O ministro havia mandado na terça-feira passada a retirada do ar do material em que Jullyene acusa o parlamentar de agressão física, estupro e envolvimento em corrupção.
Moraes afirmou que “informações obtidas após a realização dos bloqueios” indicaram que os conteúdos derrubados não podem ser considerados como pertencentes a “um novo movimento em curso, claramente coordenado e orgânico, e nova replicagem, de forma circular, desse mesmíssimo conteúdo ofensivo e inverídico”, como havia sido apontado por Lira.
O ministro destacou que os conteúdos liberados são “veiculações de reportagens jornalísticas que já se encontravam veiculadas anteriormente, sem emissão de juízo de valor”. Com isso, podem voltar ao ar publicações do jornal Folha de S.Paulo e dos portais Terra e Brasil de Fato. Um vídeo da Mídia Ninja, no entanto, continua bloqueado.
Como mostrou a jornalista Malu Gaspar, Moraes determinou na terça-feira a retirada do ar de dois vídeos e duas matérias jornalísticas com as acusações feitas por Jullyene
A supressão dos conteúdos foi um pedido da defesa de Lira, que já havia obtido de Moraes uma vitória anterior, na última quinta-feira, com a remoção de um perfil na rede social X que chamou o presidente da Câmara de “estuprador” em letras maiúsculas.
Ao STF, a defesa de Lira alegou que há um “movimento orgânico, encadeado, de divulgação de notícia mentirosa” e “altamente ofensiva”, com o “claríssimo propósito de desestabilizar não apenas a figura política” do parlamentar, mas também de “atingir o exercício da elevada função da Presidência da Câmara dos Deputados”. Os advogados do presidente da Câmara falaram ainda em um “ecossistema de desinformação e desconstrução de imagens”.
Ao determinar a suspensão, Alexandre de Moraes avaliou que “não há, no ordenamento jurídico, direito absoluto à liberdade de expressão”.
Entidades criticam
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) manifestaram preocupação com a decisão do ministro. Em comunicados sobre a decisão, a ANJ e a Abraji defenderam o trabalho jornalístico e destacaram que a liberdade de imprensa é um dos princípios básicos da Constituição.
“A ANJ observa que a Constituição brasileira é clara na defesa da plena liberdade de imprensa e afasta qualquer possibilidade de censura prévia”, disse a associação em nota.
A entidade ainda afirmou que espera que, em respeito a esse princípio da Constituiçao, a proibição imposta a veículos jornalísticos seja revista e anulada.
A associação destacou que parlamentares, como agentes públicos, estão sujeitos a maior escrutínio, sobretudo em fatos de interessa da sociedade que dizem respeito à sua vida pessoal, respeitadas as boas práticas do jornalismo, ocmo a verificação de informações e o direito de fesa.
“No caso de denúncias de violência doméstica e sexual, o tema é de enorme importância e sensibilidade, tendo-se de considerar respeitosamente sempre o testemunho da suposta vítima”, afirmou a associação.
A associação sublinho ainda que a decisão de Moraes de reconsiderar a censura às publicações foi acertadas, mas lembrou que ainda há outros veículos que tiveram suas reportagens retiradas do ar.
“Isso posto, para a Abraji, as seguidas decisões desfavoráveis à liberdade de imprensa afrontam o dever de informar, o que pode acarretar em enormes prejuízos para a democracia e para a sociedade. Não são aceitáveis medidas judiciais que removam conteúdos jornalísticos sem que haja a demonstração da motivação e fundamentação específicas para realizar ato tão grave. Por isso, foi acertada a revogação, ainda que parcial, da decisão do ministro Moraes. Esperamos que essa situação seja estendida aos demais veículos de comunicação afetados”, afirmou a Abraji no comunicado.