O ex-presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas, desembargador Fernando Tourinho de Omena Souza, é alvo de um processo administrativo disciplinar (PAD) no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), após denúncia apresentada pela advogada Adriana Mangabeira Wanderley, em 8 de janeiro deste ano. O caso está sob relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, corregedor nacional de Justiça, e já apura o envolvimento de 79 pessoas ligadas ao Judiciário alagoano.
A reclamação nº 0000111-37.2025.2.00.0000, aceita pelo CNJ, denuncia uso indevido de decisões em plantão judicial, benefícios a políticos locais e atuações reiteradas em favor da Braskem, empresa envolvida em um dos maiores desastres ambientais de Maceió.
Plantão judicial e nomeação de familiar
O ponto de partida da denúncia é uma decisão proferida por Tourinho em 27 de dezembro de 2024, durante o recesso forense. O caso envolvia o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), e tratava da implantação da chamada “faixa-verde”, alteração urbanística na orla da capital alagoana.
O processo, que tramitava na 14ª Vara da Fazenda Pública, havia tido liminar concedida suspendendo as obras. Porém, o prefeito recorreu diretamente ao presidente do TJ/AL durante o plantão de fim de ano, e Tourinho suspendeu os efeitos da liminar, autorizando a continuidade do projeto.
Cinco dias depois, em 2 de janeiro, o filho do desembargador, Fernando Tourinho Lisboa Souza, foi nomeado para um cargo comissionado na Secretaria Municipal de Gestão de Pessoas e Patrimônio (SEMGE) — nomeação assinada pelo mesmo prefeito beneficiado pela decisão do pai.
Relação com a Braskem
A denúncia também menciona decisões anteriores em que o desembargador Tourinho teria atuado em benefício da empresa Braskem S.A., investigada por sua responsabilidade no afundamento de cinco bairros em Maceió.
Um dos casos ocorreu em abril de 2023, quando a Justiça estadual determinou o bloqueio de mais de R$ 1 bilhão da empresa. A Braskem recorreu no feriado de Tiradentes, e três dias depois, Tourinho, em plantão, determinou o desbloqueio dos valores.
Há ainda o relato de um processo antigo, de 2012, em que a própria Adriana Wanderley era parte autora contra a Braskem. Segundo ela, Tourinho compôs a turma julgadora que novamente decidiu a favor da empresa — episódio descrito como sendo marcado por “condutas incompatíveis com a imparcialidade judicial”, com menções à entrada de advogados da Braskem no tribunal “portando malas”.
Pedidos ao CNJ e desdobramentos
Na petição, a advogada pede que o CNJ:
- Notifique o desembargador para prestar esclarecimentos;
- Determine à Diretoria de Tecnologia da Informação do TJ/AL a identificação da máquina que assinou a decisão do dia 27/12;
- Apure a possível prática de favorecimento a autoridades locais e à Braskem;
- E, caso confirmadas irregularidades, aplique as penalidades previstas na Lei Orgânica da Magistratura (LOMAN).
O PAD já foi instaurado e o corregedor determinou prazo de 15 dias para manifestação do magistrado. Caso sejam confirmadas as infrações, Tourinho poderá sofrer sanções como advertência, remoção compulsória, aposentadoria forçada ou até perda do cargo.
“Missão cumprida”?
Ao encerrar seu mandato na presidência do TJ/AL, no dia 7 de janeiro de 2025, o desembargador declarou à imprensa e aos colegas: “Missão cumprida”. Para a autora da denúncia, a declaração soa como um deboche institucional, diante dos graves indícios narrados.
“A sociedade brasileira está cansada da injustiça institucionalizada. O Judiciário precisa ser exemplo — e não palco de blindagens e trocas de favores”, afirmou Adriana Mangabeira à reportagem.
Procurado, o Tribunal de Justiça de Alagoas não se manifestou até o fechamento desta edição. A defesa do desembargador também não respondeu aos contatos da reportagem.
Veja o pedido na íntegra: CNJ FERNANDO TOUTINHO Despacho[1]