Jorge Messias no STF acena para evangélicos, mas levanta dúvidas sobre direito ao aborto

O direito ao aborto é uma das principais dúvidas que recaem sobre o posicionamento do provável novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Jorge Rodrigo Araújo Messias. Ministro da Advocacia-Geral da União (AGU) e próximo de Lula (PT), ele é evangélico batista, embora seja considerado uma figura “de esquerda”.

Antes de se aposentar, no dia 17 de outubro, o ex-ministro do STF, Luís Roberto Barroso, deixou o segundo voto a favor da descriminalização do aborto voluntário nas primeiras 12 semanas de gestação, que ainda não tem maioria formada na Corte. Apesar de que o substituto de Barroso está impedido de votar neste julgamento, ainda há outros processos em andamento que tratam do direito ao aborto.

Um deles é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 989, que estava sob relatoria de Barroso, no qual quatro entidades da sociedade civil pedem ao Supremo que determine a adoção de providências para garantir o aborto em hipóteses permitidas pelo Código Penal e no caso de gestação de anencéfalos.

Discreto, Messias não costuma fazer declarações sobre temas que levantam polêmicas. Porém, à frente da AGU, agiu contra a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM), que proibia a assistolia fetal [um procedimento para interromper a gravidez]. Em junho do ano passado, um ofício assinado por ele e enviado ao STF, afirmava que a resolução era inconstitucional. “A indução de assistolia fetal é o procedimento recomendado para a realização do aborto legal, especialmente nas gravidezes com tempos gestacionais avançados”, dizia o texto. A Agência Pública pediu um posicionamento de Messias sobre a descriminalização do aborto, por meio da AGU. A reportagem será atualizada quando a resposta for recebida.

Messias, que é diácono da Igreja Batista Cristã de Brasília, é visto como alguém que tem boa interlocução com setores mais conservadores. Tanto que foi destacado para participar, como representante do governo Lula, da Marcha para Jesus, em junho deste ano. O evento é organizado em São Paulo pelo Apóstolo Estevam Hernandes e a Bispa Sônia, da Igreja Renascer em Cristo, que são muito próximos do ex-presidente Bolsonaro.

Se assumir a vaga no STF, ele será o segundo ministro evangélico na Corte, ao lado de André Mendonça, que é presbiteriano e foi indicado por Bolsonaro. Para a pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (ISER), Lívia Reis, a possível dobradinha evangélica “é um sinal dos tempos”. “Temos 30% da população do país evangélica. Então, isso acaba alcançando todos os estratos da sociedade”, considera.

Para ela, uma indicação de Messias é também “um claro movimento político de resgate com o campo evangélico”. “É um sinal de uma tentativa de Lula para indicar à população evangélica que ele está atento a isso, porém, colocando uma pessoa que tem posicionamentos mais conectados com o campo progressista. Isso faz parte também de uma disputa sobre o que é ser evangélico na sociedade hoje, porque o evangelicalismo é lido necessariamente como um conservadorismo. Então, colocar uma pessoa evangélica mais ligada com pautas progressistas é também ressignificar esse lugar.”

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