A advogada alagoana Adriana Mangabeira Wanderley, conhecida por sua atuação em defesa das vítimas do desastre ambiental causado pela Braskem em Maceió (AL), tornou-se alvo de quatro ações judiciais por danos morais movidas pela procuradora de Justiça Maria Marluce Caldas Bezerra, indicada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para ocupar uma vaga no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
As ações, protocoladas na 12ª Vara Cível de Maceió, estão registradas sob os números 0735015-81.2025.8.02.0001, 0735007-07.2025.8.02.0001, 0734251-95.2025.8.02.0001 e 0733809-32.2025.8.02.0001. A procuradora alega que foi ofendida por publicações feitas por Adriana em redes sociais, nas quais a advogada associa sua nomeação a um “acordão político” e aponta “negligência funcional” e “blindagem institucional à Braskem”.
Nas ações, Marluce requer remoção das publicações e indenizações por danos morais, nos valores de R$ 10 mil e R$ 50 mil, alegando que os conteúdos ferem sua honra e reputação funcional. A advogada, por sua vez, sustenta que suas manifestações estão amparadas pela liberdade de expressão, prevista no artigo 5º, inciso IX, da Constituição Federal, e também pelo Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94), que protege a crítica no exercício da profissão.
“O que há é crítica política fundamentada, baseada em documentos públicos, fatos notórios e interesse coletivo. O Judiciário não pode ser usado para intimidar vozes dissonantes”, afirmou Adriana à Folha.
Carta ao presidente
Além das postagens, a advogada é autora de uma carta aberta enviada ao presidente da República, em abril deste ano, em que expressa “grave preocupação” com a possível nomeação de Marluce Caldas para o STJ. No texto, Adriana lembra que a procuradora é tia do atual prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (JHC), que assinou acordo judicial com a Braskem — considerado controverso por grupos de atingidos e atualmente contestado na Justiça.
“Essa nomeação comprometeria não apenas a aparência de imparcialidade, mas a confiança nas instituições do sistema de Justiça”, escreveu Adriana no documento.
A carta, divulgada publicamente, também critica o contexto político da indicação e afirma que ela representa uma ameaça à reparação justa às vítimas do desastre.
Negligência funcional
As críticas da advogada não se restringem à articulação política. Em suas publicações, Adriana menciona um relatório da Corregedoria Nacional do Ministério Público, que aponta falhas na atuação funcional de Marluce enquanto procuradora. A Reclamação Disciplinar nº 1.00588/2020-99 registra que a então procuradora apresentou baixo desempenho em áreas sensíveis, como infância e juventude, acumulando procedimentos abandonados por anos, ausência de ações coletivas, passividade diante de violações de direitos sociais e desorganização administrativa.
Embora o processo tenha sido arquivado — por motivos formais, como prescrição e contexto da pandemia — o conteúdo do relatório permanece como registro de avaliação negativa. Para a advogada, os apontamentos da Corregedoria colocam em dúvida a capacidade da procuradora para ocupar uma cadeira no STJ.
Reações e jurisprudência
O caso gerou mobilização de entidades civis e juristas, que veem nas ações movidas por Marluce uma tentativa de silenciamento institucional. A defesa de Adriana cita precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) que protegem a crítica a agentes públicos.
Em julgamento do RE 511961/SP, a ministra Cármen Lúcia escreveu que “o homem público está sujeito a críticas mais severas e amplas”. Já na ADPF 130, o então ministro Carlos Ayres Britto defendeu que a crítica política, ainda que “ácida ou incômoda”, é protegida constitucionalmente como fundamento do Estado Democrático de Direito.
Nos quatro processos ajuizados, a procuradora Marluce Caldas solicita indenizações que somam, no mínimo, R$ 120 mil:
No processo nº 0735015-81.2025.8.02.0001, o pedido é de R$ 30 mil;
No processo nº 0735007-07.2025.8.02.0001, também de R$ 30 mil;
No nº 0734251-95.2025.8.02.0001, o valor solicitado é de R$ 10 mil; e
No processo nº 0733809-32.2025.8.02.0001, o pedido atinge R$ 50 mil.
Os valores reforçam a percepção de Adriana, de que as ações têm efeito intimidatório, com potencial de gerar impacto financeiro desproporcional a críticas legítimas de interesse público.