Na Costa do Marfim, mudanças climáticas afetam agricultores e mercados

Nos últimos meses, a cidade de Soubré, no sudoeste da Costa do Marfim, tem enfrentado escassez de produtos básicos nos mercados locais. Alguns dos alimentos mais consumidos no local, como a banana-da-terra, a mandioca e o tomate, tornaram-se escassos ou inacessíveis. Isso pode ser um sinal precoce do impacto mais amplo das mudanças climáticas nas comunidades rurais e urbanas da África Ocidental.

Moradora de Soubré, Melaine Kouassi disse ao Mongabay que ficou difícil de encontrar banana-da-terra. “No passado, era normal ter períodos em que certos produtos eram difíceis de achar”, afirma. “Mas agora, podemos passar quase o ano inteiro sem ter o suficiente nos mercados. A banana-da-terra, por exemplo: desde o ano passado, mal se vê por aí.”

Kouassi conta que um cacho com cinco bananas-da-terra agora custa 1.000 francos CFA (US$ 1,75) — duas a três vezes mais do que há três anos. Ela também observa que o preço do tomate dobrou no último ano.

Fatima Koné, uma jovem que vende produtos agrícolas em Soubré, afirma que a escassez está aumentando no campo.

“Eu vou até as plantações buscar os produtos, mas no momento não há banana-da-terra. Simplesmente não conseguimos encontrar. E o pouco que conseguimos, está sendo vendido por preços muito mais altos”, diz ela.

Por que isso acontece?

Yvan Saraka, um jovem agricultor especializado em pimentas, afirma que as safras de várias culturas básicas diminuíram devido às mudanças no clima local, que causam longas estiagens e, por vezes, chuvas intensas.

Morador de Gnamadji, uma importante região agrícola a cerca de 45 quilômetros de Soubré, ele conta que a colheita de pimentas deste ano foi devastada pela seca. “Cultivamos pimentas nas baixadas porque as plantas precisam de irrigação constante. Mas quando há seca, não tem água e tudo seca. Aí, quando chove, as baixadas alagam. Se a água não evapora, estraga a plantação.”

Ele acrescenta que a seca também tem prejudicado outros agricultores. “Seja em plantações de banana-da-terra, mandioca ou inhame, temos o mesmo problema: as lavouras não sobrevivem a longos períodos de seca, e isso reduz drasticamente a produção”, diz Saraka.

As culturas de commodities voltadas à exportação também não foram poupadas. Soubré é uma das principais regiões produtoras de cacau do país. Parfait Koffi Yao, produtor de cacau na vila de Obrouayo, a 18 km de Soubré, descreve como enchentes destruíram plantações inteiras no fim de 2024, acabando com meses de trabalho e deixando agricultores em crise.

“Durante a safra de dezembro, os agricultores não conseguiram produzir nada. O rio Sassandra transbordou e alagou as plantações. É algo que nunca vimos antes nesta região”, afirma Yao.

Célestin Oura, agricultor na vila de Kossou, a 15 km de Soubré, conta que na região os produtores costumam cultivar outros produtos, como pimenta e banana-da-terra, junto ao cacau.

No entanto, a maioria das plantações de cacau foi severamente afetada pela seca, pelas chuvas intensas e por doenças nas lavouras. Como resultado, vender os alimentos cultivados já não é uma opção para muitos agricultores este ano.

“As plantações já não produzem como antes. Também não vendemos cacau como antes. Então, quando temos apenas uma pequena colheita de inhames ou bananas, preferimos guardar essa comida para alimentar nossas famílias do que vender”, diz Oura. “Às vezes, diante da dificuldade, alguns agricultores vendem uma pequena parte da colheita, mas na realidade, eles não ganham dinheiro suficiente.”

Produção de mandioca por cooperativa de mulheres em Dona

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As longas estiagens também estão afetando os agricultores em Toumodi, cidade no centro da Costa do Marfim. Muitas mulheres cultivam mandioca como sua principal fonte de renda (a mandioca é usada para fazer attiéké, um prato fermentado muito apreciado pela classe média do país). No entanto, esse trabalho está se tornando cada vez menos lucrativo à medida que as chuvas se tornam cada vez mais imprevisíveis.

“As plantações já não produzem como antes”, diz Yvonne Konan, plantadora de mandioca. “As chuvas não vêm mais regularmente, e isso impede que a mandioca cresça de modo adequado. Como resultado, a produção está muito baixa e temos que aumentar os preços só para sobreviver.”

Nos últimos meses, essa situação levou à escassez de attiéké na capital econômica do país, Abidjan, onde grande parte da colheita de mandioca de Toumodi normalmente seria vendida.

Em Tiassalé, outra cidade no sul da Costa do Marfim, as bananas-da-terra já estavam em falta no início de abril.

Soluções para aumentar a produção de alimentos

Mahi Zahabi, técnico agrícola que trabalha na região de Soubré, afirma que os agricultores precisam de mais treinamento para lidar com os desafios relacionados ao clima e outros fatores que contribuem para a degradação do solo e a queda das colheitas. Ele destaca especificamente o desmatamento nas plantações, o uso excessivo de pesticidas e a má manutenção das lavouras.

“Os agricultores precisam de treinamento em novas técnicas agrícolas, porque muitos não sabem como se adaptar às mudanças climáticas”, afirma. “Também é importante conscientizar os produtores sobre o uso mais responsável de pesticidas.”

A Costa do Marfim é o maior produtor mundial de cacau e castanha de caju e o maior produtor de borracha da África. Mas essas culturas não atendem diretamente às necessidades alimentares da população. Ironicamente, a destruição das florestas para expandir as plantações de cacau, borracha e, mais recentemente, castanha de caju, é parcialmente responsável pelas condições climáticas extremas que agora ameaçam os meios de subsistência e a produção de alimentos.

A corrida por outras plantações de commodities

Embora o cacau tenha se tornado menos lucrativo, os agricultores não estão migrando para a produção de outros alimentos. Jean Kouakou, motorista de táxi rural com quem a equipe da Mongabay se encontrou na estrada de volta de Obrouayo, compartilhou sua experiência: “Eu herdei uma plantação de 2 hectares [5 acres], mas ela não produz mais nada”, diz ele.

“Se você olhar para diferentes regiões hoje, verá plantações desaparecendo em todos os lugares. E doenças que nunca vimos antes agora se espalharam”, acrescenta.

Kouakou diz que planeja substituir suas árvores de cacau por seringueiras. Embora a Costa do Marfim continue a importar certos produtos alimentícios de países vizinhos como Mali, Burkina Faso e Níger, especialistas como Zahabi afirmam que é crucial que o país estabeleça uma política doméstica forte que apoie os agricultores locais para que possam aumentar sua produção e resistir melhor aos impactos devastadores das mudanças climáticas.

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